Circula nas redes sociais e no Whatsapp um texto sobre comparações entre a margarina e a manteiga. Algumas informações são verdadeiras, parte imprecisa e muitas delas falsas. Veja o que os especialistas comentam sobre as premissas.
A margarina foi criada para alimentar perus?
TRECHO DA MENSAGEM: “A margarina foi originalmente criada e fabricada para engordar perus. Porém, quando os perus começaram a morrer por causa dela, os empresários que tinham investido na pesquisa dela, buscaram uma utilização alternativa que lhes permitisse, no mínimo, recuperar o investimento. Foi aí que algum ‘pesquisador’ teve a ‘INFAME IDÉIA’ de juntar nela um corante amarelo, pois ela era, até aí, uma substância branca, e botou também um pó de sabor artificial; Tornando-a mais apetecível e atraente para o consumo humano e a apresentaram no mercado como um substituto da manteiga”
É falso. A nutricionista Anna Carolina Di Creddo Alves, do Serviço de Nutrição e Dietética do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), afirma que “a margarina foi criada pela indústria alimentícia como uma forma de substituir a manteiga, que estava sendo condenada por sua quantidade de gorduras”.
Segundo a nutriconista Karein Clack, que atua no Instituto Central do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP, a margarina foi inventada em 1886, na França, como alternativa à manteiga, que era muito mais cara.
A manteiga tem um pouco mais de gorduras saturadas?
TRECHO DA MENSAGEM: “A manteiga tem um pouco mais de gorduras saturadas (8 gramas contra 5 gramas da margarina)”
Isso é verdade. A nutricionista Anna Carolina afirma que a manteiga, por ser de origem animal, tem gorduras saturadas. A margarina, por ser formada por um óleo vegetal que passa por processo de hidrogenação, acaba contendo em sua fórmula gorduras trans.
Karein Clack explica que se a gordura é mais sólida, ela tem mais chance de ter gordura saturada. “Óleo de coco tem gordura saturada, por exemplo. Mas quanto mais a margarina for cremosa, menos gordura saturada ela tem”, conta.
Margarina triplica risco de doença cardíaca coronária?
TEXTO DA MENSAGEM: “Triplica risco de doença cardíaca coronária”
É falso. Não é possível afirmar que o risco de doença cardíaca coronária chegue a triplicar em pessoas que consomem margarina. A nutricionista Karein Clack afirma que o estilo de vida da pessoa é o que verdadeiramente altera o risco de desenvolver a doença. “Depende mais se a pessoa é sedentária, se ela fuma, se ela bebe álcool, do que o que ela consome. As margarinas de hoje sem gordura trans oferecem bem menos riscos que a manteiga, por exemplo. Mas se ela comer à vontade, ela pode engordar e aí desenvolver uma doença cardíaca.”
Anna Carolina diz que a margarina light é uma alternativa. “Eles pegam essa mesma molécula, e acrescentam mais óleo vegetal. Isso rearranja as cadeias de hidrogênio e nos livra da gordura trans. Mas não há estudos conclusivos que comprovem o efeito dessa nova gordura no corpo.”
A margarina aumenta o colesterol total e o colesterol ruim, e diminui o colesterol bom?
TEXTO DA MENSAGEM: “Aumenta o colesterol total e o LDL (este é o colesterol ruim) e diminui o colesterol HDL (o colesterol bom)”
É verdade. A gordura trans causa essa transformação das taxas no corpo. Por isso, a Anvisa e a OMS orientam que o consumo de gorduras trans não ultrapasse 1% de calorias ao dia. “Não pode passar de 2 gramas em uma dieta de 2000 calorias”, afirma Karein Clack, que também orienta o consumidor a ler o rótulo antes de comprar o produto. “Vai estar escrito que aquela margarina passou por outro processo.”
A margarina aumenta o risco de câncer em 500%?
TEXTO DA MENSAGEM: “Aumenta o risco de câncer em 500%”
É falso. Não é possível afirmar que o risco de câncer aumenta em 500%. A nutricionista Anna Carolina afirma, porém, que a gordura trans presente no alimento altera e aciona elementos que estão associados ao risco de desenvolver a doença. Karein Clack explica que algumas margarinas, inclusive, são enriquecidas com vitaminas antioxidantes, que são anticancerígenas e anti- inflamatórias. Mas alerta que, se ingerida livremente, a margarina pode levar a pessoa a ganhar peso e, posteriormente, a desenvolver doenças.
A margarina reduz a qualidade do leite materno?
TEXTO DA MENSAGEM: “Reduz a qualidade do leite materno”
Não é verdade. Tanto a nutricionista do Incor quando a do Hospital das Clínicas afirmam que essa afirmação não tem nenhuma fundamentação científica.
A margarina está a apenas uma molécula de ser plástico?
TEXTO DA MENSAGEM: “E, finalmente, a parte mais interessante e perturbadora: A margarina está a apenas uma molécula de ser… PLÁSTICO. Ela possui 27 ingredientes que existem na… TINTA de pintar. Se não está convencido faça a seguinte experiência: Abra uma embalagem de margarina e deixe-a aberta num local à sombra durante alguns dias. Você poderá constatar algumas coisas muito interessantes: 1.º Não haverá moscas e nem formigas (Isso quer dizer algo??) 2.º A margarina não apodrece, não tem decomposição ou alteração no cheiro (como os alimentos normais); 3.º Não cria bolor. Nada se desenvolve ou cresce nela; Mesmo largada á semanas num lugar qualquer; Ou seja, nem as moscas nem os mais pequenos microrganismos se interessam pela margarina, pois; Não há nada de bom nela. Porquê? Bom, porque a margarina é quase PLÁSTICO. OBS: Se retirar dela a anelina que dá a cor amarela e o pó que dá o sabor, só sobra um produto branco QUE É USADO PELOS SURFISTAS PARA PASSAR NAS PRANCHAS; ‘A PARAFINA'”
Totalmente falso. A nutricionista Anna Carolina explica que a margarina não é criada a partir de uma molécula de plástico, mas sim de um óleo vegeral, que pode ser de milho, soja ou canola, que passa por um processo de hidrogenação. “A gente tem a transformação desse óleo em margarina. Não vira parafina nem nada disso.”
Karein Clack alerta apenas que a margarina estraga se não conservada de forma correta. “Tudo tem seu prazo de validade. Se você deixar uma margarina fora da geladeira, ela vai apodrecer. A diferença de uma molécula de um produto dá uma diferença gritante. O humano, a girafa e o grão de soja têm a mesma composição química, mas mudando a sequência de DNA viram outras coisas.”
Controvérsias
Algumas frases do texto que circula no WhatsApp causam divergências entre as profisisonais. Sobre a margarina e a manteiga terem a mesma quantidade de calorias, uma afirma que os valores nutricionais são bem parecidos e a outra diz que são diferentes se forem comparados 100 gramas de cada alimento. Sobre a margarina diminuir a resposta imunológica e à insulina do nosso corpo, não se trata de algo automático. Uma nutricionista afirma que a gordura trans presente na margarina pode ocasionar um processo de inflamação, prejudicando o sistema imunológico e que o excesso do consumo do produto pode ocasionar o desenvolvimento de diabetes tipo 2, que diminui a resposta à diabetes. Já a outra profissional conta que consumir muita gordura pode prejudicar a saúde do corpo levando à obesidade, o que pode, por consequência, prejudicar o sistema imunológico e o processamento da insulina.
A afirmação de que pesquisas mostram que a margarina pode aumentar em 53% as doenças cardíacas em mulheres, em relação aquelas que comem manteiga, não é de toda errada. Há, de fato, um estudo publicado em 1997 no periódico de medicina “The New England Journal of Medicine” que conclui que eliminar a gordura trans da dieta reduz as chances de desenvolver doenças cardíacas em 53%, depois de analisar os hábitos de 80 mil enfermeiras durante 14 anos. Consultadas sobre a publicação, as nutricionistas afirmam que as conclusões nesses estudos são controversas e que podem já não ter mais validade, dado que, para ter um resultado confiável, as pacientes não deviam ter consumido nenhum tipo de gordura durante todo esse tempo.
1 comentário
Ótima matéria! Assunto interessante sobre o qual realmente existem muitas dúvidas.