A primeira prova de fogo do plano de emergência criado para a Barragem Casa de Pedra, em Congonhas, na Região Central de Minas, tropeçou em fatores técnicos. Ontem, quando a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) fez o primeiro simulado para possíveis situações de rompimento da estrutura, que funciona como reservatório de lama de mineração, foram identificadas falhas nos sistemas de alerta em relação à mobilidade das pessoas e ao uso de meios de comunicação e de rádio. O treinamento foi feito em áreas dos bairros Residencial e Cristo Rei, onde estão cerca de 1,5 mil residências que ficam a cerca de 250 metros da barragem e seriam imediatamente atingidas em caso de acidentes. A preocupação com a estabilidade da Barragem Casa de Pedra, que passa por obras preventivas, afeta a comunidade e se tornou alvo de estudo de grupo já existente no governo de Minas para tratar de assuntos relacionados às consequências da chuva. O Ministério Público de Minas Gerais e o Ministério do Trabalho cobram explicações e ações da mineradora, que chegou a ter as atividades no barramento interditadas, em 11 de outubro.
O treinamento de ontem foi o primeiro de uma série de outros simulados previstos para o ano que vem e que devem ser contínuos. No simulado foi feito teste com duas sirenes, que emitiram som de alerta e mensagem de evacuação de residências para moradores; deslocamento de funcionários da empresa de áreas nos dois bairros para pontos de encontro identificados como locais seguros, além de avaliação da sinalização instalada pela empresa nessas rotas de fuga. No total, são oito pontos de encontro.
Participaram da ação o Departamento Nacional de Produção Mineral, Defesa Civil Estadual, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Ministério do Trabalho, Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Secretaria de Trânsito, líder comunitário do Bairro Residencial, Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e o Núcleo de Emergência Ambiental (NEA).
BAIXO VOLUME
As falhas que ocorreram durante o teste ontem foram alvo de queixa da população e também reconhecidas pela empresa e pelo grupo de Defesa Civil montado pela prefeitura. Para quem estavam em casa no momento dos testes, o principal apontamento foi o volume da sirene. “O toque foi muito baixo e a mensagem de esvaziamento sai de forma distorcida. Não é clara”, queixou-se a funcionária pública P.A.V.C, de 27 anos, moradora de uma casa localizada a cerca de 250 metros da barragem, no Bairro Cristo Rei. A funcionária pública, que reprovou o simulado, ainda critica a efetividade do plano. “Estamos quase dentro da barragem. Se ela se romper, não temos como nos salvar”, disse a mulher, cuja família pensa em se mudar para outro ponto da cidade diante do medo de um acidente. “Vivemos com uma sensação horrível. Qualquer barulho à noite, já achamos que é um problema na barragem”.
Assim como ela, o aposentado Agostinho Gonçalves, de 74, morador da Rua Delfina Santos Correia, de 74, teve a mesma impressão sobre o volume da sirene. “Se a pessoa estiver dentro de casa ou dormindo, ou se o trem ou mesmo um ônibus passarem na hora, não vai dar para escutar, porque é muito baixo”, disse o morador, que reside há 20 anos no local. Já o vizinho Hélio Simões Souza, também aposentado, lembrou um aspecto importante. “Essa sinalização não considera as cheias do rio, que em períodos chuvosos chega a formar um lago na rua, com a água na altura de um metro. Como as pessoas vão correr então nessa direção se pode haver enchentes?”, questionou.
DESLOCAMENTO
O momento em que a sirene vai tocar também é uma dúvida entre os moradores. “Se tocar na hora que se romper, nem adianta, porque estamos imediatamente à frente da barragem. A situação aqui é diferente de Bento Rodrigues (Mariana), que ficava a alguns quilômetros e as pessoas tiveram cerca de 20 minutos para deixarem o povoado. Aqui não daria tempo de sair vivo”, disse a engenheira civil Pâmela Miranda, de 23. No teste de ontem, o tempo médio de deslocamento foi em torno de 6 a 7 minutos, segundo a CSN. O irmão de Pâmela, Luciano de Paula, de 30, que é engenheiro de controle e automação, critica o modo de tratamento dos resíduos, baseado em barragens. “Já existem empresas, inclusive aqui no município, que tratam sem a necessidade de criar uma barragem de rejeitos”, afirmou.
Uma das estruturas da Barragem Casa de Pedra, o Dique de Sela, onde as obras estão sendo feitas, contém 9,2 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e se eleva a cerca de 80 metros sobre o município de Congonhas. Na cidade, o Bairro Dom Oscar é outro que ainda seria imediatamente atingido em caso de rompimento. “É importante destacar que barragem está em Congonhas há mais de 20 anos e é uma estrutura muito próxima da área urbana. Então é um problema que temos que enfrentar. Hoje foi o primeiro passo para garantir segurança das pessoas. Estamos procurando mudar para uma cultura de prevenção, que não existe em nosso país, e todas a mineradoras que têm barragem vão passar a ver isso de maneira diferente”, afirmou o secretário municipal de Meio Ambiente, Neylor Aarão, também membro do grupo de Defesa Civil que ajudou na construção do plano.
O secretário confirmou a necessidade de ajustes técnico após o simulado. Ainda segundo o secretário, o grupo envolvido com o simulado vai avaliar se será feito um novo teste nos equipamentos ou se serão feitos simulados por setores. “Estamos pretendendo criar setores dentro dos bairros para que a gente faça pequenos ensaios até o dia do grande simulado, que deve ser depois do carnaval”, disse Neylor.
Reavaliação e segurança
Uma reunião está marcada para amanhã, entre representantes da CSN e de todos os órgãos envolvidos no simulado em Congonhas, onde serão avaliadas as situações percebidas durante o teste de ontem, para aprimoramento do plano emergencial. De acordo com o coordenador do plano e gerente-geral de Sustentabilidade da CSN Mineração, Eduardo Sanches, serão feitas adequações do volume das sirenes em algumas regiões. Outros fatores não consideradas no teste de ontem – como trânsito em dias úteis e passagem do trem –serão observadas posteriormente. Ele avaliou o tempo de deslocamento – entre 6 e 7 minutos – como “dentro do planejado”, mas ressaltou que será preciso fazer o treinamento com comunidade dentro de suas casas. Reafirmou que Barragem Casa de Pedra é segura, sem rachaduras e sem risco de rompimento. Segundo ele, a obra no Dique de Sela é um reforço, que foi realizado preventivamente. (As informações foram reproduzidas do jornal Estado de Minas)