O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem chance quase nula de conseguir liminar no Supremo Tribunal Federal (STF) que suspenda a execução da sentença de prisão do TRF-4. Essa decisão reverteria a negativa do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas não é algo que se costuma fazer, alerta o ministro Gilmar Mendes, do STF. O que se costuma fazer nesses casos é enviar o caso de volta ao tribunal de baixo. Ao mesmo tempo, ele não acredita nem sequer que haja comoção no país, caso Lula acabe preso, tampouco aposta em candidatos que não têm vivência de relação com o Congresso. “De quatro eleitos desde 1988, dois terminaram e os dois que não terminaram, aparentemente, não tinham vivência na relação com o Congresso”, diz ele.
Mendes concedeu entrevista ao programa CB.Poder, parceria do Correio Braziliense e da TV Brasília ontem, o último dia como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro não tira totalmente a razão de quem fala do “ativismo politico” no Judiciário: “Há muito ativismo e muitas decisões calcadas em uma narrativa flácida, frouxa”, diz, atribuindo o caso da ministra Cristiane Brasil, impedida de tomar posse pela Justiça ao enfraquecimento do governo Michel Temer. “Uma decisão como essa não se tomava no governo Fernando Henrique Cardoso. A debilidade do governo encoraja”. Confira os principais trechos da entrevista.
É possível que o ex-presidente Lula consiga uma liminar e vá às eleições sub judice?
Acho difícil. Crime contra a administração pública, em segundo grau, é quase um caso de inelegibilidade aritmética. Em princípio, ele não vai poder ser candidato, a não ser que atue e consiga suspender e anular a decisão criminal do TRF-4. Vai para o Superior Tribunal de Justiça, depois para o Supremo com recursos.
É possível que algum ministro conceda liminar para suspender os efeitos da condenação dele garantindo a elegibilidade?
Acho muito difícil que alguém dê liminar e não traga para julgamento no colegiado. Seria uma insegurança jurídica enorme para o país um presidente eleito com liminar. Há uma noção de institucionalidade que não vai permitir esse tipo de coisa.
Quando Lula critica a Justiça ou mesmo os petistas, isso é uma forma de desrespeitar o Judiciário?
Sim. Até do lado de quem tem responsabilidade para o funcionamento do estado de direito, faltou resposta para isso. Tanto quanto a declaração da senadora Gleisi (Hoffmann, PT-PR) como para a declaração do senador Lindberg (Faria, PT-RJ). É claro que isso foi feito em tom de provocação. Tanto é que no dia seguinte houve a apreensão do passaporte.
Mas o senhor acha que o Supremo tem coragem de mandar prender Lula, considerada a repercussão que isso pode causar?
Isso não pode acontecer! Se houver o entendimento de que se execute, ou seja, com a decisão de segundo grau ou com o trânsito em julgamento, e se não houver decisão do acórdão da sentença, ele será preso.
E a possível prisão do ex-presidente Lula? O senhor acredita que uma eventual prisão causaria comoção no país?
Não vejo essa possibilidade. É importante que se reconheça o direito de recorrer do presidente. É uma decisão inicialmente do STJ, que negou uma liminar, mas continua competente para decidir o mérito do habeas corpus. Não obstante, a defesa do ex-presidente decidiu levar a matéria ao Supremo, que está com o ministro Edson Fachin. Ele certamente vai analisar. Há uma súmula, já tradicional nossa, chamada 691, que diz que não cabe habeas corpus, em princípio, contra decisão de indeferimento de liminar. Portanto, o tribunal, em princípio não conhece, devolve para o tribunal, que chamamos de baixo, resolver a primeira questão. Isso caberá ao relator, e ele poderá escolher também a hipótese de discutir isso na turma ou eventualmente afetar o plenário.
O Brasil vai ter um presidente da República preso? Cumprindo pena na prisão?
Tenho muita dúvida. Se ele não consegue anular a prisão, muito provavelmente a questão de inelegibilidade está resolvida. Apesar de todas as falhas que temos tido, temos um grau de institucionalidade.
Em relação à prisão em segunda instância, o voto de hoje do ministro Alexandre de Moraes, favorável, na primeira turma, pode já dar uma luz de como o Supremo vai se posicionar a respeito?
Pode definir. Ver como isso vai ficar em termos de formação do colegiado geral.