Pentacampeão brasileiro (1993, 1994, 1998, 2003 e 2004), técnico do Cruzeiro na inesquecível campanha da Tríplice Coroa, ex-comandante de Atlético, Real Madrid e Seleção Brasileira e colecionador de histórias no mundo da bola.
Aos 65 anos e cotado para ser o novo treinador do São Paulo, Vanderlei Luxemburgo ostenta currículo invejável, mas, sem as mesmas conquistas de outrora, luta contra os críticos que o consideram fora dos padrões para o futebol moderno.
O treinador nascido em Nova Iguaçu (RJ) relembra o trabalho feito na Raposa há 15 anos, revela o sentimento de frustração por não ter obtido o mesmo sucesso no Galo em 2010, opina sobre o trabalho de Tite na Seleção e projeta os favoritos para brigar pela taça mais cobiçada do planeta na Copa da Rússia.
Em 2003, você entrou para a história do Cruzeiro e do ‘calendário brasileiro’ com a conquista da Tríplice Coroa. O que guarda daquele ano e qual era o diferencial daquela equipe?
Aquela equipe começou a ser formada em 2002, quando perdemos a classificação com um gol do Romário, contra a Ponte Preta. Ali, perdemos a classificação e começamos a montar o time para 2003. Para mim, o diferencial era a coesão da equipe, e mais o Alex, que nós preparamos para ficar bem liberado e botar para fora todo o seu talento. Fizemos um trabalho muito bem feito com ele. Estava magrinho, com percentual de gordura baixíssimo. Banquei ele, porque o pessoal do Cruzeiro não queria renovar. Eu disse que até pagaria o salário dele. Foi o diferencial daquela conquista da Tríplice Coroa.
Sete anos depois, você desembarcou em Minas para comandar o Atlético. Por que aquele time não ‘encaixou’ para se tornar vitorioso? Até que ponto comandar os treinos de cadeira de rodas influenciou nesse insucesso?
Não é que não encaixou. Futebol é complicado. A minha lesão, com certeza, contribuiu muito para que as coisas não funcionassem como deveriam. Ganhamos o Campeonato Mineiro e, na sequência, no Brasileiro, tive a minha lesão. Não existe treinador de cadeira de rodas. Tanto é que, sempre que me refiro ao Atlético, falo que fiquei devendo uma participação boa. Foi um clube que me deu uma grande estrutura, com um grande presidente que era o (Alexandre) Kalil, um dos melhores ou o melhor com quem trabalhei até hoje. Fico muito chateado por não ter conseguido dar o retorno esperado. Na cadeira de rodas, não tinha como ser tão participante e atuante.
O Tite está recebendo os elogios por merecê-los. Ele está realizando um grande trabalho. A CBF deveria renovar com ele para a próxima Copa, antes mesmo do início desta
Este ano tem Copa do Mundo. Para você, quais seleções podem fazer frente ao Brasil e figurar como favoritas?
Acho que o Brasil é forte candidato, pelo trabalho que o Tite está fazendo, mas vejo Argentina e França também como duas candidatas a conquistar a Copa. Espanha e Alemanha são fortes, mas vejo a França, com a base da última Copa do Mundo, e a Argentina, vice-campeã, com o Messi precisando fazer uma grande participação para levantar o caneco. O Brasil tem o Neymar despontando e está com uma equipe muito boa.
Todo mundo tem rasgado elogios ao trabalho realizado pelo Tite na Seleção. Você faria algo diferente do que tem sido feito por ele? Se sim, o que?
O Tite está merecendo os elogios por merecê-los. São coisas normais. Cada treinador tem uma maneira de pensar. Ele está realizando um grande trabalho, e torço para que ele conquiste a Copa do Mundo. Acho, inclusive, que a CBF deveria fazer com ele uma renovação para uma próxima Copa, antes mesmo do início desta.
Já enxerga o Neymar como candidato ao prêmio de melhor do mundo? Se não, o que falta?
O Neymar tem tudo para ser o melhor do mundo. Está no caminho certo. Essa lesão pode trazer um pouco de perda de espaço, mas vamos torcer para que tudo dê certo e que ele faça um grande Copa do Mundo para conquistar esse direito.
Para você, quem venceria o duelo hipotético entre Palmeiras de 1993/94 e Cruzeiro de 2003?
Não gosto de comparação. São duas equipes diferentes, de qualidade, e vocês teimam sempre em fazer comparação. Cada momento é cada momento.
O seu currículo abarrotado de títulos é de causar inveja a qualquer um. Contudo, você é visto por muitos como ‘ultrapassado’. A memória do brasileiro e esse tipo de comentário te entristece? Ou serve como estímulo e desafio para dar uma resposta ou você não vê que seja necessário rebatê-los?
A imprensa teima em rotular alguém. Pelo menos, parte dela. Não querem saber do currículo. Isso não me preocupa. Se você for ao dicionário, vai ver que “ultrapassado”, “ultrapassando” ou “ultrapassar” é deixar alguém para trás. Já deixei tudo isso para trás, inclusive as coisas que fiz. Estou acompanhando o que tem pela frente, procurando ver as coisas que estão acontecendo.
No programa “Bola da Vez” do canal ESPN Brasil, você elegeu o Romário como o melhor jogador que dirigiu. Por que ele ficou de fora da sua lista na Olimpíada de Sidney?
Não existe treinador de cadeira de rodas. Sempre que me refiro ao Atlético, falo que fiquei devendo uma participação boa. Fico chateado por não ter conseguido dar o retorno esperado. Na cadeira, não tinha como ser tão atuante
O Romário foi um dos grandes ou o melhor que já dirigi. Na época, porém, ficou combinado com a comissão técnica e com a CBF que não levaríamos nenhum jogador acima de 23 anos. Se você quiser ter boa vontade, você vai ver que não foi uma coisa com o Romário. Não foi direcionada para ele. Hoje, com a experiência que eu tenho, com certeza eu faria diferente e levaria três jogadores acima dos 23, que poderia incluir o Romário e outros jogadores.
Por que o futebol europeu não recruta mais treinadores brasileiros, ao contrário do que tem feito com os argentinos?
O futebol europeu nunca foi de buscar muitos brasileiros, até porque falamos português e não temos outro idioma. Na nossa cultura de educação, você só fala um idioma, a não ser que invista em você. Os argentinos, os chilenos e os uruguaios vão pelo mundo. No Brasil, pagam muito bem aos técnicos. Como eu trabalhei no Real Madrid, sei que a nossa qualidade é muito forte e poderíamos estar trabalhando em alto nível na Europa.
Qual a sua grande ambição na carreira? Qual o maior sonho que guarda para, talvez, encerrar um ciclo na profissão?
Eu sempre tive objetivos. Tenho objetivos de realizar um trabalho em alto nível e conquistar títulos, como sempre conquistei, e encerrar a carreira naturalmente, não por imposição. Acho injustos as pessoas quererem que você encerre a carreira de qualquer maneira. Na hora que tiver que parar, vou parar, mas trabalhando em alto nível.
Uma possível carreira política pode ser um caminho a ser seguido? Seu nome chegou a ser especulado como Senador por Tocantins…
Sempre gostei de política. Acho muito interessante. Se eu parar com o futebol, de repente posso buscar uma carreira política ou alguma coisa fora de campo, contribuindo com a minha capacidade de ser gestor no futebol.
*Entrevista concedida ao jornal Hoje em Dia