Depois de praticamente quatro anos de concessão e apenas 13% da duplicação finalizada, a BR-040 entra na mira do Tribunal de Contas da União (TCU). O órgão acaba de aprovar um pente-fino nas obras e no processo de relicitação da rodovia. A auditoria irá avaliar se existem irregularidades no contrato.
No centro das investigações está uma denúncia feita ao TCU pelo Congresso Nacional de que a Via 040, empresa responsável pela estrada, não teria realizado as intervenções prometidas entre Juiz de Fora, na Zona da Mata, e Brasília. No trecho, praças de pedágio funcionam desde 2015. O pedido foi acatado pelo tribunal no mês passado.
O pedido de averiguação enviado ao TCU menciona “prejuízos à sociedade advindos da insuficiência de desempenho da empresa”, conforme documento do órgão, que o Hoje em Dia teve acesso.
Previsto
O contrato prevê a duplicação de 557,2 quilômetros (km) em cinco anos. Mas, de 2014 para cá, os trabalhos foram concluídos em apenas 73 km, o equivalente a 13%. Em junho de 2015 – 15 meses após a concessão –, a intervenção já era realidade em 59,9 km, ou cerca de 10% do total. Exatamente o percentual acordado para que o pedágio fosse iniciado.
Um mês depois, nove das onze praças existentes foram ativadas, com a cobrança de R$ 4,60 para automóveis. Passados quase três anos, as obras avançaram em apenas três quilômetros. E a tarifa básica subiu 15%, chegando aos atuais R$ 5,30.
Denúncia
Ainda conforme a denúncia, outras intervenções combinadas não saíram do papel, como a construção de trincheiras e passarelas no perímetro urbano.
Em setembro do ano passado, a Via 040 solicitou à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a entrega da rodovia. O pedido, segundo a ANTT, ainda está sendo analisado e, caso seja acatado, a estrada será licitada novamente. “A cobrança de pedágio continua, pois a empresa continua fazendo a manutenção, conforme previsão contratual”, afirma, em nota, a ANTT.
Resposta
Também por meio de nota, a Via 040 informou que “desde que assumiu a concessão, em 2014, está adimplente com suas obrigações e realiza contínuos investimentos em obras, equipamentos, manutenção do pavimento, conservação e a melhoria da sinalização”. A empresa alega que a duplicação está pendente de licenciamento ambiental, sendo que o trecho entre Belo Horizonte e Congonhas, na região Central, segue em análise pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).
Já o Ibama diz que a autorização está pendente devido à falta de ações e documentos da própria concessionária, como o estudo de relevância de cavidades e metodologia construtiva de pontes e bueiros.
Motoristas e pedestres reclamam das condições da via
Enquanto não há uma definição da Agência Nacional de Transportes Terrestres, motoristas que passam pelo trecho concedido reclamam das más condições da via. Dentre as queixas, buracos no pavimento, falta de acostamentos e riscos de acidentes nas pistas simples. Para os pedestres, a principal reivindicação é a instalação de passarelas.
Na semana passada, a carreta do motorista Marcos André Alexandre, de 38 anos, quebrou, próximo a Congonhas. “Fiquei parado no meio da pista porque não tinha acostamento. O reboque demorou seis horas e tive que dormir dentro do caminhão, correndo riscos”, relatou Marcos, enquanto aguardava pelos reparos no veículo em um posto de gasolina.
Segundo ele, a entrega das bobinas de aço que transportava, em Porto Alegre, aconteceria com pelo menos um dia de atraso. “Sem contar que se a rodovia fosse duplicada, essa viagem seria muito mais rápida e segura”.
Caminhoneiro há 15 anos, Fábio Barros, de 35, não vê diferença na estrada que roda desde o início da profissão. “É cada buraco que a manutenção precisa ser feita com muito mais frequência. Só vejo a limpeza de placa e mato no entorno da rodovia ou a instalação de quebra-mola para atrasar a viagem”, reclama.
Pedestres
Moradora de Conselheiro Lafaiete, cidade da região Central cortada pela rodovia, Maria Lúcia de Almeida, de 63, se arrisca diariamente. “A gente tem uma passarela só, e muito longe. Não dou conta de andar tanto”, contou, segundos antes de quase ser atropelada por um ônibus. “Aqui é assim. A gente tem que andar na beirada do asfalto e quase é levada pelos carros”.
Além Disso
Modelo precisa ser revisto
Especialista em transporte e trânsito, Márcio Aguiar acredita que a duplicação da BR-040 está mais longe. Ele lembra que a Via 040 já sinalizou que a concessão não é interessante economicamente. Assim, uma nova licitação poderá ser deserta, ou seja, sem empresas interessadas. “O governo tem que rever o modelo de concessão. Caso contrário, não teremos as melhorias necessárias em infraestrutura”, afirma.
Intervenções planejadas
Constam no relatório das principais obras da própria Via 040 a conclusão do viaduto Telésphoro, na altura de Congonhas, além de quatro retornos e a modernização de 19 postos de Serviço de Atendimento ao Usuário (SAU). A reforma de quatro postos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) também é uma das intervenções previstas.
Redução de acidentes
Em nota, a Via 040 disse que “nos últimos quatro anos, 19 mil placas foram instaladas ao longo do trecho concessionário. Antes da concessão, o trecho possuía 5 mil placas. O cronograma de implantação dessas placas sempre esteve de acordo com o contrato”. A concessionária afirma ainda que os investimentos foram responsáveis pela redução de 36,9% do número de acidentes entre Belo Horizonte e Juiz de Fora, comparando-se os anos de 2012, 2013 e 2014 (antes da concessão) com os dados de 2015,2016 e 2017. Ela não informa, no entanto, o número absoluto dos acidentes citados.