A cada dez assassinatos consumados ou tentados de mulheres em Minas, oito são tipificados como feminicídio, crime hediondo motivado apenas pela questão do gênero. Engrossando essa estatística, em pouco mais de 24 horas, dois atos de covardia aconteceram na Grande Belo Horizonte. Em ambos, as vítimas receberam tiros certeiros na cabeça, disparados por policiais civis que não estavam trabalhando, sem qualquer chance de defesa.
Dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) apontam que, no ano passado, 512 mulheres foram vítimas de homicídios ou tentativas. Nada menos que 433 crimes foram considerados feminicídio. A classificação, existente desde 2015, eleva a pena máxima de 20 para 30 anos de cadeia.
“Atestar que 80% dos assassinatos são feminicídios é comprovar o que todo mundo sabe, que mulheres são mortas, em sua maioria, em contexto de violência doméstica ou simplesmente por uma questão social, que as coloca em desvantagem perante os homens”, afirma o criminalista André Myssior, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG).
Para a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa Sobre a Mulher da UFMG, Marlise Matos, os crimes refletem uma sociedade “assimétrica, hierárquica e patriarcal”. Em outras palavras, diz ela, é fruto de uma cultura que coloca o sexo feminino em situação de inferioridade.
“As mulheres têm conquistando espaços no mercado de trabalho e nas universidades. Mas, vivemos em uma sociedade que não tolera que possamos fazer o que quisermos com nossos corpos e vidas”.
Casos
Ontem, a vítima foi Ludmila Leandro Braga, de 27 anos, assessora parlamentar de um vereador de Contagem. Insatisfeito com o fim do relacionamento, o escrivão Cláudio Roberto Weichert Passos, entrou na Câmara Municipal, por volta das 9h, e disparou pelo menos quatro vezes contra a ex-companheira.
O laudo da perícia ainda não foi concluído, mas um tiro acertou a boca da jovem, que morreu na hora. Em seguida, Cláudio atirou contra si mesmo e, até o fechamento dessa edição, estava internado em estado grave na capital.
A vítima deixa duas filhas, de 3 e 6 anos. “Foi puro machismo, ele achou que era dono da Ludmila”, afirmou o pai dela, o funcionário público Leandro Braga. Muito abalado, ele esteve na Câmara. “Quando uma pessoa não quer, vai embora, cada um segue seu caminho”.
O policial estava afastado das funções devido a problemas psicológicos. Pelos colegas, era considerado um profissional exemplar. Em 2015, chegou a receber o diploma de cidadania honorária da Prefeitura de Betim.
Na segunda-feira, outro agente tirou a vida de três mulheres após fugir da Casa de Custódia da Polícia Civil. Ele atirou contra uma mãe e as duas filhas, depois de ser condenado por ter estuprado as meninas, de 15 e 18 anos. Nos dois casos, a corporação emitiu nota informando que as investigações foram iniciadas e serão acompanhadas pela Corregedoria-geral.