Minas Gerais lidera o ranking entre os estados brasileiros onde há mais municípios com eleitores que habitantes. Das 853 cidades mineiras, 75 têm mais pessoas nas urnas do que morando nessas localidades. De acordo com pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o segundo e o terceiro lugares ficaram com São Paulo (29) e Santa Catarina (20), respectivamente. Na outra ponta, Acre, Rondônia e Roraima não têm ocorrências do gênero. O estudo teve como base os dados eleitorais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para 2018 e o Censo 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em Rubelita, no Norte de Minas, por exemplo, essa diferença é de 776 pessoas, já que há 6.789 habitantes, mas, nos dias de eleições, a população aumenta para 7.565 pessoas, segundo dados do TSE. Em 2016, a diferença entre o candidato eleito e o segundo colocado foi de 750 votos. Lá, o vereador que alcançou o melhor resultado obteve 543 votos.
Segundo uma funcionária da administração municipal, que preferiu não se identificar, essa discrepância realmente existe na cidade. “Os moradores ausentes sempre retornam para votar. Nossa cidade é pequena e não oferece oportunidades para os jovens que, na maioria das vezes, terminam o ensino médio e mudam para outros municípios para estudar e trabalhar, mas sempre voltam para rever os parentes e votar”, explicou.
No município de Catuji, que fica a 70 quilômetros de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, o “fenômeno” também acontece. Na cidade, fundada em 1992, a diferença entre o número de eleitores e de habitantes é de 897 pessoas. Em 2016, o prefeito eleito teve 488 votos a mais que adversário. No caso do Legislativo municipal, o vereador mais bem votado recebeu 313 votos.
Em Sem Peixe, na região de Ponte Nova, a diferença chega a 735 pessoas. Segundo o chefe de gabinete do prefeito, Wilson Pereira da Silva, nos dias de eleições, os moradores ausentes retornam para votar e visitar familiares e parentes. “As pessoas vão embora por falta de oportunidades de estudo e de trabalho, mas tradicionalmente retornam nessas datas. Eles fazem churrascos e se reúnem com os familiares, votam e depois retornam para as cidades onde moram e trabalham de fato”, comentou.
“O que este estudo demonstra é que, em 231 cidades do Brasil, o número de eleitores é maior do que a população. Se por um lado isso pode ser explicado pela mobilidade das pessoas que mudam o domicílio eleitoral para suas cidades de origem ou para cidades litorâneas, podemos também alertar para uma reclamação constante dos gestores municipais – a de que as suas respectivas populações estão subestimadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística”, destaca o presidente da CNM, Glademir Aroldi.
A maior disparidade ocorre no município Macuco (RJ), com 1.466 eleitores a mais que habitantes. Em seguida está, Rifaina (SP), com diferença de 937 pessoas.
São Paulo tem o maior eleitorado do país, com 33,293 milhões de votantes e 22,78% do total. Em segundo lugar vem Minas, com 15,619 milhões ( 10,69%). No ranking das regiões com mais eleitores, os dez primeiros colocados são as capitais. Já o município com menor número de eleitores é Araguainha (MT), que contabiliza 945 votantes.
TSE monitora transferências para evitar possíveis fraudes
Morar em um local e votar em outro não é crime eleitoral. Segundo o promotor de Justiça Eleitoral e coordenador das Promotorias Eleitorais de Minas Gerais, Edson Rezende, o ideal é que as pessoas aptas a votar exerçam esse direito onde residem ou trabalham. “A legislação eleitoral não exige que a pessoa transfira o título eleitoral para outra cidade”, afirmou.
No entanto, o Cadastro Geral de Eleitores do TSE monitora o “movimento” dos eleitores, para verificar a possibilidade de fraudes. “Um dos indicativos de fraude é se a diferença entre o número de eleitores e de habitantes é superior a 65%. Outro aspecto é se o percentual de transferências é 10% superior à média dos anos anteriores”, explicou.
Nesse caso, o Ministério Público Eleitoral solicita a instauração de processo junto ao TSE, para apuração que pode resultar no recadastramento de todos os eleitores do município. “Aqueles que não aparecem têm o título excluído. Da mesma forma, fornecer informações erradas sobre o domicílio no processo de cadastramento eleitoral configura crime, com pena de reclusão de até cinco anos”, destacou Rezende.
Segundo o promotor, os casos de fraudes eleitorais acontecem, em sua maioria, nas eleições municipais, onde 100 votos podem decidir o pleito em uma cidade pequena.
O professor do Ibmec e especialista em Direito Constitucional, Alexandre Bahia, demorou 10 anos para transferir o título de eleitor de Pitangui, no Centro-Oeste mineiro, para a capital. “Existe um vínculo afetivo devido à família e uma maior proximidade com prefeito e vereadores. As pessoas acreditam que votar no interior ajuda a cidade de origem a melhorar”, disse.