Os casos de assédio promovidos por brasileiros na Rússia se sucedem. Em um deles, que veio à tona nesta quarta-feira, por meio de um vídeo, um morador de Montes Claros, no Norte de Minas, induz uma mulher estrangeira que não fala português a repetir palavras de cunho sexual. O homem só não esperava que sua imagem aparecesse no reflexo dos óculos escuros da vítima. Minutos depois, a gravação viralizou nas redes sociais e permitiu a identificação do autor. Trata-se do comerciante Leandro Dias. Ele é dono de uma loja de conserto e acessórios de telefone de celular no Shopping Popular, no Centro de Montes Claros.
Na gravação, Leandro Dias, que veste a camisa da Seleção Brasileira, pede para que ela repita palavras obscenas. “Você vai dar para todo mundo de Montes Claros”. Em seguida, ele sugere à mulher que diga mais uma frase: “Montes Claros, melhor b* do mundo”. A garota, sem ter noção do teor dos termos, atendeu aos pedidos sorrindo.
O caso gerou revolta imediata em Montes Claros, de 400 mil habitantes, localizada a 430km de Belo Horizonte. Ao longo do dia, vários moradores do município fizeram postagens nas rede sociais manifestando indignação com o comportamento de Leandro Dias. Por conta da repercussão negativa, ele apagou perfis no Facebook e no Instagram.
“Infelizmente algumas pessoas não sabem viver em sociedade e não possuem educação! Tenho nojo de gente assim!”, reagiu um internauta da cidade. “Essas pessoas têm merda na cabeça. Só pode”. “Montes-clarense não aguenta ver uma vergonha dessas”, indignou-se outro morador
A família de Leandro Dias, que mora no Bairro Jardim Palmeiras, também possui várias lojas no centro de comércio popular. Uma delas, inclusive, vende camisas com as cores verde e amarelo da Seleção Brasileira. À reportagem, uma funcionária disse que o estabelecimento pertence à mãe de Leandro e que ninguém falaria sobre o vídeo produzido pelo comerciante na Rússia. Outros comerciantes do local também não quiseram comentar o assunto.
O shopping popular onde fica a loja de Leandro Dias pertence ao Instituto de Previdência Municipal (Prevmoc). O presidente do Prevmoc, Eustáquio Filocre Saraiva, lembrou que o comerciante é apenas um “permissionário” do centro de compras e lamentou o episodio. “Lamentamos muito. Foi um absurdo desse, que, projeta internacionalmente o nome da nossa cidade de forma negativa. Foi uma atitude isolada, que não reflete o pensamento da população de Montes Claros e do nosso país”, disse Saraiva.
A professora Claudia de Jesus Maia, coordenadora do grupo de pesquisa “Genêro e Violência”, do departamento de Historia da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), afirma que os vídeos com atitudes preconceituosas contras as mulheres que vieram à tona durante a Copa do Mundo refletem uma situação que sempre ocorre e que precisa ser combatida.
“Essa situação sempre se repete em nosso cotidiano e mostra e que temos uma sociedade misógina, que o gênero feminino é tratado com um estereótipo”, afirmou. “Nos sentimos mais envergonhadas e ofendidas. É como se a mulher fosse reduzida ao seu órgão sexual para poder ser usada pelo homem”, considerou Claudia Maia, ao avaliar a atitude do comerciante de Montes Claros.
A pesquisadora salienta que o comportamento machista e o preconceito contras as mulheres exigem um trabalho educacional. “Temos que mudar esse tipo de comportamento. Temos que investir na educação, ensinando o respeito às pessoas e buscando o fim do machismo e do preconceito”, destacou.
PRIMEIRO VÍDEO
Um vídeo no qual torcedores brasileiros aparecem ao lado de uma jovem na Copa do Mundo da Rússia viralizou nas redes sociais e no WhatsApp neste fim de semana.
Nas imagens, o grupo de ao menos cinco homens, alguns com a camisa da seleção brasileira, tenta convencer a moça a gritar uma frase impublicável, uma referência constrangedora a ela própria. Trata-se da velha piada de mau gosto de fazer estrangeiros repetirem termos chulos em português. Claramente sem entender o significado do que é dito, ela tenta acompanhar os torcedores.
Um dos torcedores foi identificado: é um nome com experiência em política.
Nas redes sociais, diversas postagens acusam o grupo de assédio.
“A desculpa, como sempre, “é que é só brincadeira”. Machismo/assédio não é brincadeira”, publicou o perfil Quebrando o Tabu.
“Cadê os amigos ‘mas eu não sou machista’ falando desses homenzinhos de merda sacaneando a mina russa? Que nojo. É contra esse tipo de coisa que a gente espera que vocês se coloquem, sabe? É o mínimo. Dar risadinha é compactuar”, postou a escritora Clara Averbuck.