Globo Esporte
Acostumados com as glórias que o futebol proporciona àqueles que vencem na carreira e com as chuteiras aposentadas após várias conquistas – especialmente com a camisa do Cruzeiro -, os parceiros em campo e amigos Roberto Gaúcho e Marcelo Ramos assumiram, há cerca de um mês, uma missão em conjunto. São, respectivamente, treinador e auxiliar-técnico do Valério, time de Itabira que completou 75 anos em 2017. E o desafio não é nada pequeno: subir com o time da 2ª para a 1ª divisão do Campenato Mineiro.
Roberto Gaúcho, 50 anos, e Marcelo Ramos, de 45, parecem dois garotos. Não só na vitalidade e pela qualidade que ainda batem na bola, mas pelo brilho nos olhos de quem está iniciando uma nova carreira. Cientes dos – grandes – desafios, apostam na experiência e na amizade que têm há 25 anos para se darem bem fora das quatro linhas. A comissão técnica tem, ainda, parceiros baianos e gaúchos, que Roberto Gaúcho conheceu neste início da carreira como treinador – já trabalhou no Joinvile (SC) e no Atlântico (BA).
Os dois amigos/parceiros fazem questão de passar toda a experiência para o grupo de 29 jogadores, a maioria deles com menos de 23 anos – a idade é uma exigência do regulamento da Segunda Divisão, que determina que os times disputem os jogos com, no máximo, cinco jogadores com mais de 23 anos. Mas deixam claro que só o fato de serem treinados por profissionais reconhecidos nos tempos em que estavam em campo não será suficiente – nem para ajudá-los a vencer na carreira, nem para levar o Valério à 1ª divisão.
– Estou aqui porque acredito que dentro de dois ou três anos estarei num time de Série A do Brasileiro. Então, o cara que não quiser – eu tô falando olhando no olho -, pode falar com o presidente. A gente vai montar um time forte, pra subir. Eu sou parceiro, já falei pra vocês. Sou amigo. Vou brigar por tudo com o presidente, pelo melhor pra vocês: alimentação, moradia, bola, campo… Vim pra vencer. Sou um vencedor como atleta profissional. De família humilde, saí de casa aos 13 anos e venci. Só joguei em time ‘top’ e ganhei todos os títulos, graças a Deus! Marcelo Ramos também. Ninguém veio pra passear aqui em Itabira.
E quer mostrar que o discurso não será, apenas, da boca pra fora.
– Eu e o Marcelo, hoje, vestimos a camisa do Valério, mas isso dentro de campo não ganha jogo. Do lado de fora a gente vai passar a experiência toda que a gente teve, mas eles que têm que correr, jogar para que os resultados venham – destacou Roberto Gaúcho.
Eu servi muito a ele na época do Cruzeiro. Agora é a vez dele me servir (risos)
– Eu vou trabalhar muito os atacantes. Ninguém ensina ninguém a jogar bola, mas vou orientá-los na hora certa de finalizar. Até porque muitos garotos querem aprender, que querem ajuda. Isso é importante – comentou Marcelo Ramos que, nestes tempos de Valério, vai adaptar o apelido que ganhou nos tempos de Cruzeiro.
Roberto Gaúcho vem se preparando há tempos para enveredar na carreira de treinador. Fez estágios com amigo Renato Gaúcho (no Grêmio), Vanderlei Luxemburgo (no Cruzeiro), Levir Culpi e Oswaldo de Oliveira (ambos no Japão). Já o baiano Marcelo Ramos foi pego, digamos assim….no pulo!
– Roberto me convidou em 2016. Estava parado desde 2011. Futebol só assistindo Barcelona, Bayern de Munique, Real Madrid, mas sem nenhuma intenção. Aí o Roberto: ‘Não… você tem que ser meu auxiliar porque a gente tem uma relação muito bacana de confiança’. E tem que ter isso, né? Minha esposa me incentivou também. E aqui estou eu!
O flecha azul vai ser eternizado pelo torcedor cruzeirense, que tem um carinho acima do normal comigo. Mas agora vai ter que ser o ‘flecha vermelha’…
Sonho: treinar o Cruzeiro
Os dois planejam se especializar, fazendo cursos para treinador na Confederação Brasileira de Futebol (CBF). O objetivo Roberto Gaúcho é chegar à Série A, e o sonho maior…
– Meu maior sonho é ser técnico do Cruzeiro!
– Vou fazer esses cursos de treinador. Antes eu só estava acompanhando os treinos, visitando o Cruzeiro. Meu plano é seguir com o Roberto. A gente sabe que é uma luta muito grande: vivemos no futebol e sabemos como é. Temos que ter resultado, não adianta só o nome – comentou Marcelo Ramos.
Taxista não cobra da gente. Nem em restaurante deixam a gente pagar
Personalidades em Itabira
Os gols com a camisa do Cruzeiro não saem da mente do torcedor. Até mesmo quem torce para outro time deve se lembrar de algum momento marcante dos dois ex-jogadores. A prova é que a dupla se sente meio que personalidade andando pelas ruas de Itabira, conta Roberto Gaúcho.
Reconhecimento que pode ajudar o clube. A dupla tem visitado Belo Horizonte com frequência para reuniões em busca de apoio financeiro para o Valério.
Estrutura do Valério
Fundado em 22 de novembro de 1942, o Valério está há oito anos longe da Primeira Divisão do Campeonato Mineiro. O atual presidente, morador de Itabira e torcedor do time, venceu a eleição por unanimidade no ano passado. Luis Antônio de Oliveira, o Precata, herdou uma dívida de quase R$ 8 milhões. Aproveitou o reconhecimento que tem em Itabira, por ter trabalhado por mais de duas décadas na prefeitura, para buscar patrocínios. Já são quatro. Só que o dinheiro arrecadado, até agora, só será suficiente para pagar este primeiro mês de trabalho no clube.
– Estamos numa situação difícil: vamos entrar sem muita estrutura no campeonato, mas vejo que a cidade está querendo abraçar. O Valério tem cerca de R$ 1,7 milhão em dívidas trabalhistas e entre cinco e seis milhões de reais em dívida fiscal. Se você conseguir pagar a dívida trabalhista você entra no Profut e resolve a fiscal. Por isso, estamos atrás de mais patrocínio e contamos com a ajuda da torcida – salientou o presidente.
Para isso, ele investiu cerca de R$ 30 mil na reforma do estádio Israel Pinheiro, cuja capacidade na Federação Mineira de Futebol está registrada como para 15 mil torcedores.
A Segunda Divisão do Campeonato Mineiro – que equivale, na prática, à Terceira Divisão, já que fica “abaixo” dos módulos I (Primeira) e II (Segunda Divisão – começa mês que vem. Serão três etapas: primeira fase, semifinais e final. Na primeira, as 13 equipes jogarão em turno único, sendo seis jogos como mandante e seis jogos como visitante, classificando-se para as semifinais as quatro melhores equipes. A partir daí é mata-mata.
Valério no topo
O primeiro desafio do Valério de Roberto Gaúcho e de Marcelo Ramos será no dia 12 de agosto, em Governador Valadares, contra o Ponte Nova. A expectativa é de iniciar com pé direito para já na segunda rodada levar um bom público ao reformado estádio Israel Pinheiro.
– As dificuldades são grandes por ser time do interior. O presidente tá batalhando sozinho pra contratar jogador. Tudo é caro, as viagens são longas… E o campeonato da terceira divisão é mais força, né? A técnica só não supera tudo. Mas a gente veio pra cá sabendo das dificuldades. Mas o Valério, eu acredito, está no topo entre dos treze clubes. O presidente está dando boa condição aos atletas: alimentação, moradia, material, o campo também… Acredito que a gente vá fazer um bom trabalho – finalizou o esperançoso e empolgado Roberto Gaúcho.