O atraso de mais de R$ 2 bilhões no repasse às cidades mineiras de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) pelo Estado pode deixar centenas de professores municipais do interior sem salário nos próximos meses.
Sem o fundo, a qualidade da educação no Estado tende, ainda, a cair sistematicamente, ampliando a desigualdade entre os municípios mineiros. Estudo técnico da Câmara dos Deputados aponta que sem o Fundeb a diferença no ensino poderia chegar a 10.000%. Com o fundo, a distância é de 564%.
Em Poté, no Vale do Mucuri, na divisa com o Vale do Jequitinhonha, os professores não receberam o salário do mês passado. Segundo o prefeito, Nego Sampaio (PRB), desde janeiro o repasse tem apresentado problemas. Há quatro meses, no entanto, foi interrompido. A dívida do Estado com o município de 16 mil habitantes chegaria a R$ 4,3 milhões, sendo R$ 1 milhão referente ao Fundeb.
“Não sei mais o que fazer. O governo vem pagando menos desde o começo do ano, mas em abril parou de pagar. Os professores não estão recebendo e a maioria deles é arrimo de família. Não conseguimos pagá-los sem o Estado”, lamenta. Como reflexo, o comércio da cidade já sofre as consequências.
Nego Sampaio é um dos 50 prefeitos que fazem parte da Associação dos Municípios da Microrregião do Vale do Mucuri (Amuc). Em reunião, ontem, eles decidiram aderir a uma paralisação organizada pela Associação Mineira dos Municípios (AMM) no próximo dia 21. Na data, mais de 400 prefeitos vão interromper os serviços nas cidades e se dirigir à Cidade Administrativa, no Vetor Norte de Belo Horizonte, na tentativa de pressionar o governo do Estado a pagar o débito de R$ 7,6 bilhões, conforme levantamento da AMM.
Nova manifestação
Se a ação não for bem sucedida, os prefeitos da Amuc farão um novo protesto no dia 24. “Vamos juntar os professores, os sindicatos, prefeitos e moradores do Vale do Mucuri e bater na porta do governador. Pelo menos o Fundeb tem que ser pago”, ameaça o prefeito de Ladainha e presidente da Amuc, Walid Nedir (PSDB).
Presidente da AMM e prefeito de Moema, Julvan Lacerda (MDB) afirma que 60% do Fundeb é utilizado na remuneração dos educadores. O restante deve ser usado na manutenção do ensino.
“O fundo serve para corrigir um desequilíbrio. Sem ele, os municípios pequenos, com pouca arrecadação, sofrem muito”, diz.
Em Moema, o salário de julho dos professores foi pago com verba que o prefeito guardava para o 13º dos profissionais da educação. “Usei o dinheiro e agora não sabemos como vamos arcar com o 13º”, diz.
Em São Sebastião da Bela Vista, no Sul de Minas, os professores também foram pagos com recursos próprios. No entanto, o prefeito da cidade, Augusto Ferreira (PT), já avisou aos educadores que sem o repasse do fundo não haverá salário no próximo mês.
“Vamos parar em 21 de agosto. E se não resolver, vamos parar dois dias em setembro. E se mesmo assim não resolver, vamos fechar os órgãos três dias antes das eleições”, diz o chefe do Executivo, que divide legenda com o governador Fernando Pimentel, candidato à reeleição.
Em São Sebastião do Paraíso, também no Sul do Estado, o prefeito Walker Américo (PTB) já avisou aos educadores sobre a possibilidade de eles não receberem no próximo mês. O Estado deve R$ 3 milhões ao município.
Walker afirma, ainda, que tem convênios com diversos órgãos do Estado e que para mantê-los funcionando tem feito investimentos constantes. “O nosso repasse para o Estado está em dia. A Emater mesmo me custa R$ 5 mil por mês. E já me avisaram que se nós não pagarmos eles vão parar. É absurdo”, diz.
Em nota, o governo de Minas informou que “todos os esforços estão voltados, desde o início desta administração, a honrar os compromissos em todas as regiões do Estado”.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais deferiu, ontem, liminar que obriga o governo de Minas a liberar os recursos em atraso do Fundeb a Uberlândia, uma dívida que já ultrapassa os R$ 40 milhões.