O papa Francisco reconheceu mais uma vez, com “vergonha e arrependimento”, que a Igreja Católica demorou a agir para combater casos de pedofilia, em uma “Carta ao Povo de Deus” divulgada nesta segunda-feira.
O novo “mea culpa” do pontífice chega aproximadamente uma semana depois de a Suprema Corte da Pensilvânia, nos Estados Unidos, ter apresentado um relatório que lista mais de 300 sacerdotes envolvidos em crimes sexuais, escândalo que se soma a casos em países como Chile e Austrália.
Na carta, Francisco diz que a pedofilia é um crime que gera “profundas feridas de dor e impotência, em primeiro lugar nas vítimas, mas também em suas famílias e na inteira comunidade, tanto entre os crentes como entre os não-crentes”.
“Olhando para o passado, nunca será suficiente o que se faça para pedir perdão e procurar reparar o dano causado. Olhando para o futuro, nunca será pouco tudo o que for feito para gerar uma cultura capaz de evitar que tais situações não só não aconteçam, mas que não encontrem espaços para serem ocultadas e perpetuadas”, diz o documento.
O papa ainda cita o relatório da Pensilvânia, que identificou cerca de mil vítimas ao longo de um período de 70 anos. De acordo com o líder católico, embora esses casos estejam no passado, as feridas “jamais prescrevem”.
“A dor dessas vítimas é um gemido que clama ao céu, que alcança a alma e que, por muito tempo, foi ignorado, emudecido ou silenciado. Mas seu grito foi mais forte do que todas as medidas que tentaram silenciá-lo”, afirma Francisco.
“Com vergonha e arrependimento, como comunidade eclesial, assumimos que não soubemos estar onde deveríamos estar, que não agimos a tempo para reconhecer a dimensão e a gravidade do dano que estava sendo causado em tantas vidas. Nós negligenciamos e abandonamos os pequenos”, acrescenta.
O papa ainda ressalta que a “omissão” deve dar lugar à “solidariedade”, para que as vítimas de abusos encontrem uma “mão estendida que as proteja e as resgate de sua dor”. “Essa solidariedade exige que denunciemos tudo o que possa comprometer a integridade de qualquer pessoa”, diz, em um claro recado a autoridades eclesiásticas que encobrem crimes cometidos por colegas.
Além disso, o pontífice pede “oração e jejum” para “despertar a consciência” do “povo de Deus” para o compromisso com uma “cultura contra qualquer tipo de abuso”. “É imperativo que nós, como Igreja, possamos reconhecer e condenar, com dor e vergonha, as atrocidades cometidas por pessoas consagradas, clérigos e, inclusive, por todos aqueles que tinham a missão de assistir e cuidar dos mais vulneráveis”, ressalta.
Além do escândalo nos Estados Unidos, a Igreja se vê às voltas com casos de pedofilia no Chile, que provocaram a renúncia de todo o episcopado do país, e na Austrália, que implicaram até um arcebispo, Philip Edward Wilson, condenado a 12 meses de prisão por ter acobertado crimes de abuso.
Ainda na Austrália, o terceiro na hierarquia do Vaticano, cardeal George Pell, também prefeito licenciado da Secretaria de Economia, é réu por episódios de pedofilia supostamente ocorridos nas décadas de 1970 e 1990.