Terra/Estadão
Quem chega ao gabinete 905 da Câmara Municipal do Rio pode pensar que está na assessoria do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Trata-se, porém, do local de trabalho do vereador Carlos Bolsonaro (PSC), de 35 anos, para onde ele voltou na terça-feira após deixar a equipe de transição. Filho do meio do primeiro casamento de Jair, é o mais ligado ao pai, segundo pessoas próximas à família, e também o mais impulsivo, com um histórico de aversão à mídia e paixão pelas redes sociais.[pro_ad_display_adzone id=”44899″ align=”right”]
No gabinete do vereador está estampada a adoração de Carlos pelo presidente eleito – o que pode ser vista também em seu braço, numa tatuagem com o rosto do pai. Ali estão diplomas de Jair na Academia Militar das Agulhas Negras, no curso de paraquedista, além de medalhas militares e o certificado de mergulhador autônomo. Também há quadros pintados com a figura do agora presidente eleito. Até o início deste ano, era ali que Jair Bolsonaro podia ser encontrado uma vez por semana – o gabinete funcionou como um dos QGs da campanha à Presidência.
Em agosto, o vereador se licenciou da Câmara para se dedicar à campanha. Prorrogou a licença mais de uma vez, inclusive após a eleição para auxiliar o pai na transição. O voo de Carlos rumo à administração federal, porém, foi interrompido pelo próprio presidente eleito, quando prestigiou um desafeto do filho, o advogado Gustavo Bebianno – a quem deu a função de ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência.
Até então, era esperado que Carlos assumisse uma função próxima ao pai, como uma espécie de conselheiro. No gabinete de Carlos, funcionários até estudaram as legislações que tratam de nepotismo. Mas a ideia foi descartada depois que Bebianno, já indicado, afirmou que o vereador poderia ser o titular da Secretaria de Comunicação – um sinal público de que o advogado teria mais importância que ele.
[pro_ad_display_adzone id=”44899″ align=”left”]Carlos foi o primeiro filho de Bolsonaro a entrar para a política. Foi eleito pela primeira vez para a Câmara em 2000, aos 17 anos, e assumiu em janeiro de 2001, com 18 anos recém-completados. Antes disso, tentou cursar Direito por seis meses, mas não gostou das aulas e desistiu. Já eleito, passou a frequentar o curso de Ciências Aeronáuticas pela Universidade Estácio de Sá, onde se formou.
Na Câmara, onde está há quase 18 anos, sua conduta é discreta, com poucos discursos e leis aprovadas. Neste período, o vereador assinou 42 leis aprovadas, a maioria como coautor. Seu chefe de gabinete, o sargento da Marinha da reserva Jorge Luiz Fernandes, admite que o mandato apresente “poucos projetos” mas, quando apresenta, são textos “cavernosos” (sic), diz. “Os projetos que a gente faz tem realmente interesse público, não são de Dia da Vovó ou do Gari. A pauta dessa semana, por exemplo, tem projetos que não funcionam para p… nenhuma”, afirmou Fernandes.
Em seu retorno à Casa, na terça-feira, no entanto, Carlos foi cortejado por grande parte de seus colegas – alguns até lhe pediram selfies. Foi chamado para ler a ata da sessão e se sentou à mesa da Presidência do plenário para abrir o expediente – algo incomum, segundo assessores da Casa. Avesso à mídia tradicional, Carlos não quis dar entrevista e demonstrou irritação, em certos momentos, com o assédio dos repórteres.
Um dos projetos de que Carlos mais se orgulha foi o primeiro que conseguiu aprovar: uma emenda à Lei Orgânica do Rio que terminava com o voto secreto nas discussões da Câmara. Outra lei de sua autoria que destaca é a que criou o Banco Municipal de Recolhimento de Cordão Umbilical para cura de doenças de recém-nascidos. Carlos também costuma trabalhar para barrar projetos que vão contra bandeiras “da família”, como os de diversidade de gênero, e pela Escola sem Partido. Pouco interage com os outros vereadores ou com os seus dois colegas de partido. Costuma agir com independência em relação ao PSC e consulta apenas um líder: seu pai.
Mas o que Carlos mais gosta de fazer, segundo seus assessores, é “trabalhar nas redes sociais”. “Ele fica o tempo todo aqui no celular, no Twitter”, diz o chefe de gabinete. A dedicação do vereador foi vista como fundamental para a vitória do pai na Presidência. Foi pelas redes sociais que Bolsonaro conduziu sua campanha – tinha apenas oito segundos no rádio e na televisão. No anúncio em que deixava a transição de governo, Carlos também avisou que não administraria mais as páginas do pai nas redes sociais, uma tarefa começou em 2010, quando publicou no Facebook de Jair uma foto dele com os filhos, mergulhando.
O contato entre pai e filho é próximo. Carlos mora no mesmo condomínio de Jair, em uma casa em nome do presidente eleito. Divide o local com um primo, que também é uma espécie de secretário para assuntos burocráticos, e uma cadela da raça poodle. No gabinete, fotos da cachorrinha são as únicas que dividem espaço com imagens do pai.
Reservado
Carlos praticamente abandonou seus prazeres, como praticar crossfit na praia e frequentar clubes de tiro. Diferente do irmão mais velho que é casado, e do mais novo, que casará em maio, o vereador tem uma namorada que mora no Sul, mas pouco a vê, segundo amigos. “Carlos é uma pessoa que quer ter uma vida normal, mas sabe que não tem. Também evita ambientes em que lhe perguntam sobre política, mesmo sendo político 24 horas. Não tem liberdade, mas quer ter. Ele é meio ermitão”, define Fernandes.
Segundo sua mãe, Rogéria Bolsonaro, Carlos sempre foi o mais reservado entre os três. “Ele é mais de ouvir do que falar. Observa muito, é sensível e, em 99% das vezes, ele está certo no que fala. Ele é danado. Já nos acostumamos com esse jeito dele”, afirma Rogéria.
Ela foi vereadora com o nome de R. Bolsonaro antes do filho, que a substituiu na Câmara Municipal do Rio. Derrotou a própria mãe na eleição de 2000, com apoio do pai, depois que o casal se separou.
Sobre o desentendimento recente com o presidente eleito, Rogéria e Fernandes concordam que será difícil Carlos recuar da decisão de se afastar do futuro governo. “Jair sabia o que estava fazendo. Ele ‘brincou’ com o filho”, diz Rogéria.