ALMG
A responsabilidade civil e criminal de funcionários da Vale no rompimento da Barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (Região Central), foi consenso entre os promotores públicos presentes em reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho. O que se procura saber agora, segundo eles, é até onde, na linha hierárquica da empresa, chega essa responsabilidade.
Na audiência pública realizada na quinta-feira (04/04), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), também foram ressaltadas a responsabilidade do governo estadual e a falta de cumprimento de acordos das empresas envolvidas em outro caso de rompimento de barragem de rejeitos de mineração, a de Fundão, em 2015, no município de Mariana (Região Central).[pro_ad_display_adzone id=”44899″ align=”right”]
A comparação entre os dois rompimentos foi uma constante na fala dos presentes à reunião, que se destinou a ouvir membros do Ministério Público envolvidos com a apuração das causas dos desastres.
De acordo com o coordenador da Força Tarefa Mina Córrego do Feijão, o procurador da República José Adércio Sampaio, o evento em Brumadinho tem se revelado uma repetição do que aconteceu em Mariana. Por isso, ele afirmou que o rompimento não foi um caso de negligência da empresa, mas de dolo, ou seja, de ações que desconsideraram o risco, ainda que o conhecessem.
Essas ações seriam não apenas dos setores operacionais, mas também de gestores e ocupantes de altos cargos da Vale, segundo José Adércio. Diante disso, o MP teria recomendado o afastamento de todos os funcionários ligados à geotecnia e do presidente da empresa, para evitar que eles dificultassem a investigação. O objetivo é responsabilizar civil e criminalmente todos os envolvidos, de acordo com o procurador.
O procurador federal, porém, lembrou que outros avanços que deveriam ter ocorrido depois de Mariana não foram alcançados e, assim, possibilitaram novo rompimento, resultando em mais de 300 vítimas, entre mortos e desaparecidos. Ele ressaltou que não houve reforço na política de fiscalização de barragens e, no lugar de melhorar a legislação ambiental, as normas foram flexibilizadas e passaram a facilitar a obtenção de licenças para empreendimentos de grande porte.
Convidados ressaltam responsabilidade do Estado
A aprovação de legislação que facilitou o licenciamento e a questão da fiscalização também foram criticadas pela promotora do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) Marta Alves Larche.
A dependência econômica dos municípios e de Minas Gerais da atividade mineradora estaria, para Marta Larche, entre as causas tanto do abrandamento da legislação quanto da concessão apressada de licenças. “Chega ao ponto de as empresas terem influência na pauta do órgão ambiental e discutirem diretamente com ele as mudanças na legislação e na fiscalização”, disse.
O deputado Sargento Rodrigues (PTB) concordou que há responsabilidade do órgão ambiental e que denúncias da imprensa já mostraram reuniões de empresários da Vale com representantes do Poder Público para tratar de questões que são do interesse das mineradoras. Ele defendeu que seja solicitada a quebra do sigilo bancário de pessoas envolvidas com fiscalização e concessão de licenças ambientais para averiguar se houve algum ganho ilícito para favorecer as empresas.
Para o parlamentar, a composição do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), órgão ligado à Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), é um indicativo de que é o setor produtivo que comanda os licenciamentos ambientais, posição apoiada por Noraldino Júnior (PSC).
Mineradora usa estratégias para desmobilizar vítimas e reduzir indenizações
Na comparação com o rompimento da barragem de Mariana em 2015, os presentes também salientaram que as empresas envolvidas – Samarco e suas controladoras, Vale e a australiana BHP – não estão cumprindo os acordos já firmados.
Segundo o procurador da República Helder Magno da Silva, a Renova, fundação criada para reparar os danos do evento, trabalha buscando desmobilizar aqueles que foram atingidos e colocando uns contra os outros. A estratégia seria de dizer que acordos coletivos seriam prejudiciais e que cada um teria que negociar individualmente, o que enfraquece os atingidos frente às empresas. Ele repudiou a própria criação da Fundação Renova, que representaria uma terceirização de responsabilidades.
O procurador do Trabalho Geraldo Emediato de Souza também disse que estratégias que tentam adiar o pagamento ou diminuir os valores a serem repassados para as vítimas, utilizadas com os atingidos pelo rompimento da barragem de Mariana, se repetem em Brumadinho. Nesse sentido, ele comemorou decisões judiciais de bloqueio de recursos da Vale e a liberação imediata de pensões, pelo INSS, às famílias.
Em coro com o procurador, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) chamou de “ultrajante” a publicidade que a Vale tem feito desde o rompimento da barragem em Brumadinho. “Ela está mentindo, ela não cumpre o que está dizendo. É criminoso”, avaliou.
Missão – O presidente da CPI, deputado Gustavo Valadares (PSDB), lembrou que a principal missão da comissão é descobrir os responsáveis pelo rompimento e identificar até onde o conhecimento dos riscos foi na cadeia hierárquica da empresa. André Quintão (PT), relator da CPI, lembrou que, além disso, serão feitas no relatório final recomendações para evitar novas tragédias.
O deputado Bartô (Novo) destacou a importância da iniciativa privada para economia, mas defendeu “punição severa” das empresas que descumprirem a legislação.