Depois de uma sequência de quedas no número de mortos nas rodovias federais que cortam Minas Gerais nos últimos anos, seguida por um aumento em 2017, os óbitos nas BRs sob responsabilidade da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no estado voltaram a cair em 2018, desta vez em um patamar nunca alcançado em 12 anos de série histórica. Entre especialistas, há quem aponte o controle de velocidade em rodovias, associado à adoção do uso de faróis durante o dia, como um dos possíveis motivos para a redução. O recuo histórico, porém, coincide com a decisão de interromper e revisar a instalação de radares em estradas sob jurisdição da União, por decisão do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL).[pro_ad_display_adzone id=”44899″ align=”right”]
Outro aspecto que chama a atenção no levantamento é que se, por um lado o número de vidas perdidas é o menor desde 2007, por outro as colisões em BRs no ano passado foram mais letais na comparação com o ano anterior. Os números da PRF para 2018 mostram que foram 8.741 acidentes, responsáveis por 680 mortes, o que significa média de um óbito a cada 12,83 batidas. Considerada a maior ameaça para a segurança nas estradas, a colisão frontal também foi mais letal ano passado, tirando uma vida a cada 2,41 batidas de frente. Foram 222 mortes para 537 ocorrências desse tipo.
Dados dos últimos cinco anos mostram que a letalidade das colisões frontais nunca esteve tão alta como em 2018 nas BRs mineiras. Em 2017, por exemplo, foram 289 mortos nas batidas de frente em 756 ocorrências, média de uma morte a cada 2,61 acidentes. O mesmo ocorre para o quadro de colisões em geral. Se em 2018 o ano terminou com a média de uma morte a cada 12,83 batidas em geral, em 2017 ocorreu um óbito a cada conjunto de 14,69 acidentes, com total de 869 pessoas que perderam a vida.
O número final de óbitos em todos os tipos de acidentes em 2017 representou um repique em relação a 2016, depois de três anos de quedas (2014, 2015 e 2016). Agora, a nova redução em 2018 foi bastante significativa. As 680 mortes do ano passado significam recuo de 21,75% em relação às 869 de 2017. Em relação aos acidentes, as 8.741 ocorrências diminuíram 31,23%quando comparadas com as 12.709 de 2017.
O inspetor Aristides Júnior, que coordena o Núcleo de Comunicação Social da PRF em Minas, avalia que houve mudança de comportamento dos motoristas para alcançar uma redução desse nível, já que a maior parte dos acidentes está ligada a falhas humanas. “Se há uma redução nessas falhas, se o motorista passa a adotar uma postura mais preventiva, a tendência é de que haja uma diminuição no número de acidentes, e, consequentemente, de feridos e mortos”, avalia.
Já o consultor em transporte e trânsito Osias Baptista Neto discorda dessa visão, pois, segundo ele, não houve nenhuma grande campanha educativa, nem mudança de postura dos governantes que motive mais cautela. Entre os possíveis motivos para o recuo nas mortes, ele aponta o aumento na fiscalização eletrônica fixa – como a representada pelos radares instalados pela Via 040, concessionária responsável pela BR-040 entre Brasília e Juiz de Fora – e também móvel, feita pela própria PRF. Além disso, acredita que o uso dos faróis durante o dia tem impacto nesse cenário. “Essa medida tornou as ultrapassagens mais seguras e com isso ajudou na redução das colisões frontais”, avalia. O especialista também aponta que o farol aceso orienta o condutor em relação ao motorista que vem logo atrás, prevenindo freadas bruscas que podem causar mortes.
Os dados fechados de 2018, fornecidos com exclusividade ao EM pela PRF, também apontam que mais uma vez a BR-381 foi a campeã do ranking macabro da violência rodoviária. Foram 171 mortes em 2.848 acidentes na estrada, levando em consideração os trechos de pista dupla, entre BH e São Paulo, e os de pista simples, entre a capital mineira e Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. Em segundo lugar aparece a BR-040, com 127 mortes em 1.702 batidas. O ranking das três rodovias mais letais do estado é fechado com a BR-116, que liga os estados do Rio de Janeiro e da Bahia rasgando o território mineiro. Foram 101 mortos e 1.082 acidentes no trecho em Minas da rodovia conhecida como Rio/Bahia.
INDÚSTRIA? Os dados da PRF vem à tona em um contexto de discussão, no âmbito federal, sobre a instalação de radares nas BRs brasileiras. No fim de março, o presidente Jair Bolsonaro anunciou em sua conta no Twitter que tinha determinado o cancelamento da implantação de 8 mil radares no Brasil, sob o argumento de que a colocação de equipamentos “tem o único intuito de retorno financeiro ao Estado”.
Bolsonaro também citou a presença de aparelhos de fiscalização eletrônica nas estradas concedidas à iniciativa privada: “Ao renovar as concessões de trechos rodoviários, revisaremos todos os contratos de radares, verificando a real necessidade de sua existência, para que não sobrem dúvidas do enriquecimento de poucos em detrimento da paz do motorista”, tuitou o presidente, em 31 de março. Depois disso, a Justiça impediu a União de retirar radares das rodovias, por decisão da 5ª Vara Federal Cível de Brasília.
‘Pardais’: da defesa ao ódio
A importância dos radares, também conhecidos como “pardais”, para o controle da violência nas rodovias divide motoristas na BR-381, no trecho de pista simples entre BH e Governador Valadares, segmento que passa por duplicação e se tornou conhecido como Rodovia da Morte. A equipe do EM rodou entre a capital mineira e Sabará, na região metropolitana, e pôde observar radares desligados no trecho, o que desperta reações diferentes entre condutores.
Para o vigilante Wemerson Gomes, de 31 anos, é muito importante manter o controle de velocidade em um contexto marcado pelo desrespeito dos motoristas como regra geral nas estradas. “Temos que ter radares funcionando, porque somente as placas não fazem as pessoas diminuir a velocidade. Não existe essa consciência e só toma multa quem passa acima da velocidade. Já vi cada coisa nessa 381, que o melhor é continuar com os radares”, defende.
Já a gerente de vendas Mirtes Cunha, de 40, critica os equipamentos de vigilância, porque os considera máquinas de uma indústria para gerar arrecadação. “Acho que as pessoas têm que ter a educação de diminuir a velocidade sem precisar de um radar para obrigar a isso. Têm que ser feitas campanhas educativas. Essa 381, por exemplo, não tem condição. A gente não vê as pinturas de faixas no chão, de noite não se enxergam os radares e tudo fica ainda pior com essa obra que nunca acaba”, diz ela, em referência à interminável duplicação.
A reportagem procurou o Ministério da Infraestrutura e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) para explicar quantos radares estão desligados em Minas e quantos equipamentos dos 8 mil citados pelo presidente seriam novos ou substituiriam aparelhos antigos no estado. Não houve respostas.