Cristina Kirchner, ex-presidente da Argentina, enfrenta o banco dos réus pela primeira vez nesta terça-feira (21/05), em Buenos Aires. Neste julgamento, ela responderá a acusações de corrupção em contratos durante o período em que esteve no poder, de 2007 a 2015.
O julgamento intriga a Argentina porque o país está a menos de seis meses da eleição presidencial. Cristina, inclusive, desistiu de concorrer como cabeça de chapa para disputar o cargo de vice. Ela estava em primeiro nas pesquisas de intenção de voto, desbancando o atual presidente, Mauricio Macri.
Assim, a decisão do tribunal definirá não só o futuro de Cristina – todo o desenrolar da política argentina está em jogo na sessão que começa nesta terça-feira. Veja abaixo perguntas e respostas sobre o julgamento de Cristina Kirchner.
De que Cristina é acusada?
Cristina Kirchner em imagem de novembro de 2018, na Argetina — Foto: Martin Acosta/Arquivo/Reuters
A ex-presidente responde por associação ilícita e administração fraudulenta. Cristina teria firmado contratos irregulares de obras públicas para favorecer o empresário Lázaro Báez enquanto ocupou a Casa Rosada.
Os promotores encontraram irregularidades na concessão de 51 obras públicas no valor de US$ 1,15 bilhão em Santa Cruz, Patagônia, província do sul da Argentina que foi o trampolim da ex-presidente para a política nacional.
Segundo o jornal “La Nación”, somente duas das 51 obras supostamente fraudadas foram concluídas dentro do prazo previsto. Outras 25 jamais ficaram prontas. As demais, além de atrasar, custaram mais do que o pré-determinado.
De acordo com o site de notícias argentino Infobae, era Cristina quem fixava os valores cobrados das empresas Austral, CPC, Electroingeniería e JCR. Há indícios de irregularidades também no governo de Néstor Kirchner, marido de Cristina, que presidiu a Argentina entre 2003 e 2007.
Cristina pode ser presa?
Senadora e ex-presidente argentina Cristina Kirchner chega nesta segunda-feira (3) a tribunal em Buenos Aires — Foto: Eitan Abramovich/ AFP
Nas atuais circunstâncias, não.
Caso a Justiça declare a ex-presidente culpada, ela pode ser condenada a até 16 anos de prisão. Porém, Cristina se elegeu senadora em 2017, e, por isso, tem imunidade parlamentar, o que a impede de ser presa até 2021, quando acaba o mandato.
No entanto, o Senado ainda pode cassar a imunidade parlamentar de Cristina, caso dois terços dos senadores votem a favor. A possibilidade, porém, é pequena: a maior parte dos parlamentares é do mesmo partido da ex-presidente.
Se condenada, Cristina poderá ser candidata?
Cristina afirma que será candidata a vice na chapa liderada pelo ex-chefe de Gabinete de Nestor Kirchner, Alberto Fernández — Foto: Daniel Garcia/AFP
Tudo indica que sim, de acordo com o jornal “La Nación”. Isso porque a Justiça entende que, para torná-lo inelegível, o réu deve ser julgado em todas as instâncias. E o julgamento de Cristina está no Tribunal Oral Federal 2, abaixo da Câmara de Cassação e da Corte Suprema.
Como o processo eleitoral começa oficialmente em agosto, é muito improvável que o caso seja concluído em todas as instâncias da Justiça da Argentina até o prazo final.
Ainda assim, Cristina surpreendeu quando anunciou que concorrerá como vice-presidente na chapa encabeçada por Alberto Fernández, chefe de gabinete no mandato de Néstor Kirchner.
Como vice, Cristina teria – em tese – pequeno poder no Executivo, mas comandaria o Senado, conforme a legislação argentina. O cargo garantiria a ela mais tempo de imunidade parlamentar, e ela ainda teria a possibilidade de receber um indulto de Fernández.
Quem julgará Cristina?
O Tribunal Oral Federal 2 (TOF 2) cuida do caso de Cristina Kirchner, mas o julgamento quase foi suspenso depois que a Corte Suprema da Argentina decidiu analisar recursos apresentados pela defesa da ex-presidente e dos outros réus no mesmo caso.
Após protestos de opositores do kirchnerismo, a Corte Suprema decidiu, na quinta-feira passada, que a análise dos recursos não suspenderia, adiaria ou transferiria a competência do julgamento.
Inicialmente, o julgamento deveria começar em 26 de fevereiro. Entretanto, o juiz Jorge Tassara – um dos integrantes do TOF 2 – ficou doente e morreu dias depois. Por isso, o julgamento foi transferido para 21 de maio.
Quem mais está no banco dos réus?
O ex-ministro argentino do Planejamento Federal Julio De Vido, em foto de 27 de setembro. Ele é um dos réus no processo que inclui Cristina Kirchner — Foto: Hugo Villalobos/Noticias Argentinas/AFP
Além de Cristina Kirchner, o tribunal vai julgar, no mesmo caso:
- Lázaro Báez, empresário do ramo da construção civil
- Julio de Vido, ex-ministro de Planificação Nacional
- José López, ex-secretário de Obras Públicas
- Abel Fatala, subsecretário de Obras Públicas
- Carlos Kirchner, ex-titular da Subsecretaria de Coordenação de Obra Pública Federal
- Nelson Periotti, ex-titular da Direção Nacional de Estrutura Viária
- Raúl Daruich e Mauricio Collareda, ex-chefes da Direção Nacional de Estrutura Viária para Santa Cruz
- Héctor Garro, Juan Carlos Villafañe, Raúl Pavesi e José Santibañez, ex-presidentes da Administração Geral de Estrutura Viária de Santa Cruz.
Além dos 13 réus, o julgamento – que deve durar semanas – terá mais de 160 testemunhas arroladas pela Justiça argentina.
Há outros escândalos envolvendo Cristina?
Foto de março de 2018 fornecida pelo jornal ‘La Nación’ mostra um dos cadernos de Oscar Centeno, ex-motorista ligado aos governos dos Kirchners na Argentina — Foto: La Nacion via AP
Sim, Cristina responde a outros processos e ainda deve ir a julgamento outras vezes.
Um desses escândalos é o dos “cadernos das propinas”, que eclodiu no ano passado. Nele, a ex-presidente é investigada por outro esquema de corrupção em obras públicas com subornos a empresários.
Os outros casos envolvem mais acusações de lavagem de dinheiro e até a suspeita de acobertar terroristas envolvidos no atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia).
Cristina nega envolvimento nesses e nos demais escândalos, e se defende dizendo que é vítima de perseguição política e midiática.