Causou estranheza aos deputados o depoimento do diretor-executivo de Ferrosos da Vale, o geólogo Gerd Peter Poppinga, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na segunda-feira (03/06). O executivo, segundo na linha de hierarquia da empresa, afirmou não ter nenhum conhecimento sobre os riscos de estabilidade da barragem de rejeitos B1, da Mina de Córrego de Feijão, que se rompeu em janeiro deste ano, provocando a morte de pelo menos 242 pessoas.
O diretor-executivo afirmou que não conhecia os contratos com as auditoras externas contratadas pela mineradora para analisar a estabilidade da barragem, nem foi comunicado sobre os vários problemas detectados na estrutura desde meados de 2018. “O que sabia é que a barragem estava paralisada e estava sendo elaborado um projeto de descomissionamento, mas que ainda precisavam conhecer melhor o interior dela”, afirmou.
Poppinga justificou que contratos de serviços abaixo de R$ 100 milhões não passam pela diretoria executiva e são definidos pelos executivos operacionais. Ele afirmou que, em outubro do ano passado, participou de uma reunião do departamento de Gerenciamento de Riscos do Negócio (GRN), na qual foi apresentado um quadro afirmando que mais de 90% das barragens da Vale estavam em total segurança, dez pediam alguma atenção e nenhuma necessitava de alguma intervenção imediata.
Segundo o diretor-executivo, todas as 130 barragens da Vale tinham laudo de estabilidade. Ele afirmou que a empresa trabalha sob o princípio de que “segurança de barragens se faz nas pontas”, oferecendo autonomia aos geotécnicos que cuidam do monitoramento e operação dessas estruturas.
Poppinga acrescentou que tem quase 70 mil funcionários subordinados. Sua diretoria responde por negócios no Brasil e em diversas unidades no exterior. “Não sou onipresente, nem onisciente”, disse mais de uma vez para justificar a delegação das responsabilidades para profissionais subalternos.
O relator da CPI, André Quintão (PT), os deputados Sargento Rodrigues (PTB) e Bartô (Novo) e a deputada Beatriz Cerqueira (PT), perguntaram ao diretor-executivo por que a Vale não seguiu as recomendações propostas pela auditora Tüv Süd, que atestou a estabilidade, com algumas observações.
Uma das orientações era instalar 30 drenos horizontais, para retirar a água de dentro da barragem. Em meados do ano passado, quando foi instalado o 15º dreno, houve uma fratura hidráulica na estrutura e a empresa suspendeu o trabalho.
Gerd Poppinga se limitou a dizer que não tinha conhecimento de que as recomendações não foram cumpridas. E reafirmou que não havia “sinais” de que a barragem poderia se romper.
Os deputados relataram alguns dos problemas detectados na estrutura, além dos drenos e da fratura hidráulica. Foram citados, por exemplo, os alertas de movimentações da barragem, captadas por radares, e distorções nas leituras dos piezômetros, equipamentos que medem a pressão dos líquidos no interior da estrutura.
Sargento Rodrigues considerou que a declaração do executivo configura uma tentativa de se eximir de responsabilidades. Lembrou que Poppinga já ocupava o cargo em 2015, quando rompeu a barragem de Fundão, em Mariana (Região Central), que deixou 19 mortos. “O senhor, a meu ver, é sim corresponsável por esse assassinato em massa”, disse o parlamentar.
Geotecnia
Gerd Poppinga afirmou que o monitoramento e inspeção das barragens é de responsabilidade da Gerência de Geotecnia Operacional. Segundo ele, se o técnico percebe alguma anomalia no estado de conservação da estrutura, pode acionar o PAEBM, paralisar o trabalho e promover a evacuação do local.
A Gerência de Geotecnia Corporativa é responsável por coordenar as auditorias externas para declaração de estabilidade, as revisões periódicas das barragens e os paineis com especialistas para discutir riscos.
As duas gerências são subordinadas ao diretor de Operações, Silmar Silva, que, por sua vez, se reúne regularmente com Poppinga. O diretor-executivo disse que Silmar Silva não lhe passou qualquer informação de risco da barragem da Mina do Córrego do Feijão. Ele acredita que nenhum dos profissionais percebeu o risco de rompimento.
Outros dois integrantes do alto escalão da Vale estão convocados para prestar depoimento na CPI no dia 17 de junho, Lúcio Cavali, diretor de Planejamento, e Silmar Silva, diretor de Operações. Está prevista para a próxima quinta-feira (06/06) a oitiva na CPI de Brumadinho do presidente da Vale, Fábio Shavartsman, entretanto ele já conseguiu uma liminar que o desobriga de comparecer à Assembleia, como ocorreu quando Schavartsman foi convocado para prestar depoimento na Câmara Federal.