Pelo menos duas em cada dez pessoas “negativadas” entraram na lista suja do crédito após emprestar o nome para um amigo ou até mesmo um parente que simplesmente não honrou a dívida assumida. Pior: em 53% dos casos, quem arca com o prejuízo é quem tentou ajudar o comprador. Especialistas alertam que a prática deve ser evitada ao máximo.
Os dados são da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil). Conforme o estudo, o cartão de crédito é a forma mais usada para “emprestar o nome”, aparecendo em 35% dos casos.
“Uma amiga estava organizando a festa de 15 anos da filha e eu emprestei meu cartão para ela comprar roupas para a família. Ela também pagou algumas coisas da festa com o cartão. O boleto ficou algum tempo sem aparecer e eu achei que ela estava pagando, até que descobri que eu estava com o nome sujo”, lamenta a copeira L.A.
Ela foi ao banco e tentou negociar a dívida. O problema é que, com os juros, o valor já tinha quase triplicado, passando de R$ 580 para algo em torno de R$ 1,8 mil.
L.A. fez um acordo com a instituição financeira e pagou R$ 580. O objetivo era parcelar o restante do débito. “Mas eles falaram que o acordo não tinha sido concretizado e pediram para eu depositar mais R$ 480. Paguei e agora estou acertando o restante, parcelado”, diz.
Depois do cartão de crédito, emprestar cartão de loja é a maneira mais comum de entrar na lista de negativados: responde por 20% das ocorrências. Os financiamentos aparecem em seguida, com 17%.
Promove Mafalda Ruivo afirma que o consumidor deve evitar ao máximo emprestar o nome para terceiros.
“A pessoa precisa falar ‘não’, mesmo que seja difícil. Depois que comprar, a dívida é do dono do cartão, ou do financiamento. Não vai adiantar falar que não foi você quem comprou. Além disso, o cartão de crédito é de uso pessoal e intransferível”, explica.
Já o economista Paulo Vieira pondera que se a pessoa quiser mesmo ajudar o amigo ou parente, o ideal é que faça a compra para a pessoa. Emprestar a senha ou o cartão deve ser uma prática abolida.
“Em alguns casos, a pessoa ajuda mesmo. Se alguém precisar fazer uma compra no supermercado, por exemplo, a pessoa pode ir lá e comprar. Não precisa emprestar o cartão”, diz.
Ele destaca, ainda, que é bom que a pessoa que pretende ceder avalie se ela tem condições de pagar a conta, caso o outro não quite a fatura.
“É uma questão que deve ser levada em consideração. É importante que a pessoa esteja preparada para o caso de ela ter que assumir o pagamento, afinal, os índices são altos”, alerta Vieira.
Após o calote na dívida, relacionamento entre as partes fica abalado em 94% dos casos
A proximidade é algo que acaba facilitando o empréstimo de nome, seja por cartão de crédito, cartão de loja ou financiamento. Em 27% dos casos a abordagem partiu de amigos. Em seguida, aparecem os pais (14%), filhos (14%) e cônjuges (13%). Os colegas de trabalho ficaram em quarto lugar na lista, com 12% das citações.
Na avaliação do educador financeiro do SPC Brasil, José Vignoli, emprestar o nome para amigos ou conhecidos é uma atitude solidária, mas muito arriscada. “A pessoa que pede esse tipo de favor, geralmente, já tem o próprio nome com restrição ou está com a vida financeira desorganizada, então o risco de não receber o valor gasto é alto”, alerta.
Apesar dos transtornos financeiros gerados pela atitude, 45% dos entrevistados voltaram a emprestar o nome a outras pessoas, principalmente pelo pedido ter vindo de alguém muito próximo (22%) ou por não querer prejudicar o relacionamento com a outra pessoa (10%).
O relacionamento, aliás, fica abalado em 94% dos casos em que houve calote. “Eu ainda tenho contato com a pessoa, mas fiquei magoada com o que ela fez comigo”, diz a dona de casa Renilde Ramos, que fez um empréstimo para uma amiga e não recebeu o montante.
Já a copeira L.A., que ajudou uma amiga a fazer a festa de 15 anos da filha e também não recebeu o dinheiro gasto, diz entender o momento econômico pelo qual as pessoas passam. “Ela diz que está com muita dificuldade e que vai pagar quando melhorar. Eu entendo a situação dela”, afirma.
É uma possibilidade. Das pessoas que emprestaram o nome e ficaram a ver navios, 68% cobraram dos devedores e 55% receberam o capital depois que a dívida foi paga.
Os produtos eletrônicos, como computadores, celulares e TVs (22%) despontam como o principal tipo de aquisição feita em nome de terceiros. Depois aparecem eletrodomésticos (19%), materiais de construção (11%) e móveis para casa (10%). Outra constatação é que 32% dos entrevistados não sabiam o que seria adquirido com a compra feita em seu nome.
“Muitas vezes, a melhor ajuda é orientar esse amigo ou familiar a dar prioridade para o pagamento de dívidas, em vez de estimular que a pessoa assuma mais compromissos sem saber se ela terá condições de arcar com o pagamento mais para frente”, explica Vignoli.