O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a Defensoria Pública do estado ingressaram na Justiça para que a Vale seja condenada a ressarcir os danos patrimoniais, os danos individuais homogêneos, os danos morais coletivos e os danos sociais causados à população de Nova Lima, em especial do distrito de São Sebastião das Águas Claras, conhecido como Macacos. A Ação Civil Pública (ACP) pede que a Justiça afirme a responsabilidade civil da mineradora e aponta como justificativa a prática de reiteradas condutas abusivas e ofensivas a direitos humanos e fundamentais ocasionadas pela execução de atividades ligadas às barragens localizadas na região.
Entre os pedidos da ação, estão a obrigação de custear a contratação de assessorias técnicas para os atingidos e auditoria externa, além da antecipação de indenização e pagamento emergencial às pessoas que sofreram danos, bem como a indenização de todos os custos ocasionados ao Poder Público (veja abaixo).
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Veja o andamento do processo
Na ação, as instituições apontam os danos causados às pessoas atingidas pelo acionamento do nível 2 e, posteriormente, nível 3, do Plano de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM) para a barragem B3/B4 da mina Mar Azul. No dia 16 de fevereiro, a Vale realizou a evacuação de cerca de 200 moradores da comunidade local. “Em face desta situação, a população de Nova Lima, principalmente no distrito de Macacos, não mais possui qualquer tranquilidade para definir a evolução e o seu projeto de vida, sem que exista a certeza de que o centro da comunidade e regiões adjacentes existam nos próximos meses, quanto mais o seu patrimônio e, até mesmo, as suas vidas”, afirma trecho do documento.
Segundo o MPMG e a Defensoria Pública, os atingidos se constituíram em uma coletividade de “refugiados ambientais” e uma população que foi “totalmente paralisada e isolada, no tempo e espaço, sofrendo interferência direta e indireta no seu meio de vida, sob vários aspectos, tais como o financeiro, social e psicológico”.
Custeio de R$2 bilhões
Além da manutenção do bloqueio de R$ 1 bilhão da mineradora Vale para reparação de danos materiais e morais causados às pessoas atingidas, determinado pela Justiça em março, a ACP requer que a mineradora constitua garantia suficiente para não somente a reparação dos danos, mas custeio de todas assessorias técnicas e auditorias externas necessárias para a solução da demanda, no valor mínimo de R$ 2 bilhões, bem como capital de giro nunca inferior a 100% do valor a ser utilizado, para os 12 meses subsequentes, nas despesas para custeio da elaboração e execução dos planos, programas, ações e medidas necessárias.
Caso a Justiça acate os pedidos, a Vale também deverá custear integralmente a contratação de entidade para a prestação de assessoria técnica independente às pessoas atingidas e de auditoria externa independente para análise contábil-financeira e finalística dessa entidade.
Outro pedido é para que a empresa custeie corpo técnico multidisciplinar, independente, para que elabore Diagnóstico Social e Econômico e Plano de Reparação Integral de Danos.
Antecipação de indenização e pagamento emergencial
O MPMG e a Defensoria Pública pedem que a Justiça obrigue a Vale a antecipar indenização, no valor de R$ 30 mil, para as pessoas atingidas que se enquadrem nas seguintes situações: residam ou trabalhem no distrito de Macacos; sejam proprietários, locatários, possuidores, arrendatários ou meeiros de imóvel localizado no distrito de Macacos; sejam proprietárias ou trabalhadores, ainda que sem vínculo empregatício, de estabelecimentos comerciais localizados no distrito de Macacos.
A esses mesmos grupos de pessoas, as instituições requerem também que, no prazo de 20 dias, a mineradora faça o pagamento de prestação mensal emergencial de um salário mínimo para as pessoas adultas e de meio salário mínimo para crianças e adolescentes. Esse pagamento deverá ser feito pelo prazo mínimo de um ano, podendo ser prorrogado pela Justiça. Esses valores não deverão ser descontados do valor das indenizações individuais, coletivas ou difusas, uma vez que se trata de provimento que visa mitigar os danos.
A Justiça também analisará o pedido para que a empresa não suspenda o fornecimento de voucher de alimentação a toda a população de Macacos.
Outro pedido é para que a Vale realize audiência pública judicial para a oitiva da comunidade, garantindo a representatividade das diversas coletividades atingidas ao longo da bacia do Rio Paraopeba.
Estudo atualizado de ruptura
A ACP pede que, no prazo de 20 dias, a Vale publique estudo atualizado de ruptura (Dam break) das Barragens B3/B4, B6 e B7 (Mina Mar Azul), B5 (Mina da Mutuca) e Capão da Serra (Mina Tamanduá), Taquaras (Mina da Mutuca), estabelecidas em São Sebastião das Águas Claras, considerando a zona de impacto como um todo, levando-se em conta, para tanto, os efeitos cumulativos e sinérgicos do conjunto de todas as estruturas integrantes do complexo minerário e o vazamento de 100% (cem por cento) dos rejeitos e água dispostos nas barragens, com todas as suas decorrências.
A evacuação e a sirene
A evacuação do dia 16 de fevererio foi determinada pela Agência Nacional de Mineração (ANM), após empresas terceirizadas realizarem inspeção no local e não acordarem sobre o resultado das análises quanto à segurança das barragens B3/B4 e subirem de 1 para 2 o nível de segurança das estruturas, exigindo a evacuação da população na área de autossalvamento.
Segundo relatos da população, a falta de informação, aliada ao fato de terem saído às pressas de suas casas, numa noite de sábado chuvoso, com a roupa do corpo, por medo de serem atingidas pelo arrebentamento das barragens B3/B4 da Vale e sem previsão de voltarem com segurança para suas casas, é o que mais tem causado ansiedade aos moradores que foram levados às pressas para o Centro Comunitário de Macacos. “Até a presente data não retornaram para a sua rotina, continuando abrigadas em uma pousada em Macacos e em dois hotéis em Belo Horizonte”, diz a ação.
No dia 27 de março, as sirenes voltaram a soar, mais uma vez, em Nova Lima, pois a situação agravou-se diante do risco de rompimento, que subiu do risco 2 para o risco 3, que significa risco iminente de rompimento ou que a estrutura está em colapso.
Na ação, o MPMG e a Defensoria Pública, por meio de fotos e testemunhos, apontam as diversas consequências, humanas e ambientais, sociais e econômicas, individuais e coletivas, que derivam do comportamento da Vale, incluindo os impactos em relação aos grupos de pessoas vulneráveis como crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência.
As instituições elencam uma lista de 22 direitos e garantias das pessoas violados.