“Meu filho não é mais o mesmo. Era um menino alegre, que gostava de brincar e, agora, tem medo de sair na rua, de ir para a escola e até de conversar”. A fala é de um pai que teve o filho abusado em uma escolinha de futebol em Belo Horizonte. E o menino não é o único a enfrentar o drama. Até o momento, quatro crianças denunciaram um treinador que trabalhava no local como autor de abusos e violências sexuais. O homem tem 56 anos.
O caso veio à tona na última terça-feira (13/08), quando a Polícia Militar foi acionada no Clube Progresso, localizado na região da Pampulha, para efetuar a prisão do suspeito. Ele foi denunciado por pais de alunos da escolinha. Segundo um dos responsáveis, que conversou com o BHAZ, os militares precisaram conter os familiares do filho que queriam agredir o professor na hora da prisão.
“Ninguém esperava isso dele, parecia ser um cara tranquilo. Agora, pra quê mexer com criança? Pra quê encostar em filho meu? Eu disse pra ele que ele tinha que ter feito isso era comigo, pois eu acabaria com a vida dele. Os policiais que tiveram que me pedir calma, senão eu faria alguma besteira”, diz o pai de uma das vítimas.
Segundo as denúncias, em um dos casos de abuso, o professor teria pago um dos meninos para manter relações sexuais com ele. Em outro, a conjunção carnal foi consumada. As vítimas têm entre 10 e 15 anos. Alguns pais ameaçam processar o Clube Progresso por conta dos danos físicos e psicológicos causados aos meninos. Os parentes também pedem justiça, exigindo que o treinador continue preso. Representantes do clube optaram por não comentar as denúncias (confira abaixo).
Denúncias
O primeiro a relatar os abusos aos policiais foi um menino de 10 anos. Segundo a vítima, ele frequenta a escolinha há dez meses e os abusos contra ele teriam ocorrido a partir do mês de abril deste ano.
O garoto contou aos militares que o treinador mandava o time todo ir para o campo de treino, menos ele, para que ficassem sozinhos. Ele relata que, no início, o treinador passava a mão em suas partes íntimas. Com o tempo, as violências foram tomando maiores proporções e ele acabou estuprado.
No segundo caso, a vítima foi um menino de 11 anos, que também treina na escola há aproximadamente dez meses. Ele contou aos policiais que, em março deste ano, foi trocar de roupa no vestiário quando foi surpreendido pelo treinador. O professor de futebol teria assediado a vítima, dizendo que o menino “tinha um bundão”.
No mês de abril, o professor deu um tapa nas nádegas dele. E relata também que flagrou o homem com outro aluno da escolinha – que não registrou ocorrência, ainda, contra o treinador – no vestiário, sem short. Esta outra vítima ainda desconhecida pelas autoridades teria recebido o valor de R$ 50 do treinador. Contudo, o menino de 11 anos não soube explicar a motivação de o treinador ter pago a quantia ao colega.
O caso mais grave relatado aos militares envolve um adolescente de 15 anos, que já treina no clube há cerca de um ano. Ele contou que tudo começou em setembro do ano passado, em tom de brincadeira. Na época, o treinador começou a passar a mão em suas nádegas e partes íntimas, por cima da roupa.
O menino conta ainda que, por diversas vezes, o técnico pediu para praticar sexo com ele. O garoto negou o ato, mas não foi o suficiente para dar fim aos abusos. Na última sexta-feira (9), o professor levou o menino de 15 anos para uma área de mata do clube e colocou vídeos pornográficos para o garoto assistir.
Em determinado momento, o homem aproveitou que estava sozinho com o adolescente e o estuprou. A vítima contou aos militares que o treinador deu a ele R$5 após o abuso.
Por fim, a quarta denúncia contra o treinador vem de outro menino de 11 anos, que treina na escola há três meses. Ele relatou que, no mês de junho, o professor pediu a ele para chegar mais cedo ao treinamento e o chamou para um chalé, onde o treinador fica.
No local, o homem colocou vídeos pornográficos para o garoto assistir e depois pediu a ele que tirasse a bermuda. O menino negou, mas o treinador ignorou o e colocou as mãos por dentro da roupa do menino.
Em outra ocasião, o garoto estava dobrando os coletes de treinamento com o corpo levemente inclinado para frente e o técnico chegou pelas suas costas e esfregou o pênis em suas nádegas. O garoto também contou que o professor lhe dava quantias entre R$5 e R$10. Ele pediu ao menino para não contar os abusos aos pais pois poderia “acabar com a escola de futebol”.
Consequências
Pais das vítimas do treinador conversaram com o BHAZ e ambos não quiseram se identificar para não expor as crianças. Eles relataram que, nas últimas semanas, os meninos mudaram o comportamento dentro de casa, o que levou a suspeitarem de que algo estava acontecendo.
“Meu menino sempre gostou de ir à escolinha, pediu para eu comprar chuteira, roupa etc. Porém, de uma hora para outra, ele começou a dizer que não queria ir mais. Era uma diversão, um sonho dele ser jogador e, agora, acabou. Ele era um menino alegre, agora não fala mais nada, não conversa. A justiça tem que ser feita, esse cara tem que ficar preso, nada justifica fazer isso com crianças”, relata o pai do menino de 10 anos.
Em conversa com a reportagem, o pai do menino de 15 anos contou que tem sido difícil lidar com a situação. “Eu e a mãe dele estamos segurando uma barra. Ele não sai mais de casa, não quer ir à escola e não dorme sozinho. No dia seguinte à prisão, ele contou que sonhou com o treinador correndo atrás dele. É difícil, vamos ter que procurar um psicólogo”, diz.
O pai conta ainda que pretende processar o clube pelos acontecimentos. Ele relata também que o filho, apesar de ter 15 anos, não se comporta como um adolescente. “Meu filho tem uma mentalidade de criança. Nós o colocamos na escolinha para ter a oportunidade de brincar com outras crianças, fazer amizades e não ficar isolado. E estava tudo bem, mas, de um tempo para cá ele começou a ficar nervoso, a faltar das aulas de futebol. Mas, jamais iríamos imaginar que era por causa disso. É um absurdo”, conta.
O autor dos abusos
Aos militares, o treinador negou todas as acusações. Como os meninos o acusam de colocar vídeos pornográficos para eles assistirem, o celular do suspeito foi apreendido.
Segundo a Polícia Civil, o suspeito foi conduzido à Delegacia de Plantão da Mulher e Criança em Belo Horizonte na última terça (13) juntamente com quatro vítimas e representantes legais. “Durante o procedimento, a delegada representou pelo mandado de prisão preventiva junto ao Plantão Forense”, diz a PC.
A prisão foi cumprida na madrugada de quarta (14), na própria delegacia. O homem é apontado pelos crimes de estupro de vulnerável. Ele foi preso e encaminhado ao Sistema Prisional.
Segundo o artigo 127, do Código Penal brasileiro, o crime de estupro de vulnerável consiste em: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos, com pena prevista de oito a 15 anos de reclusão. O artigo ainda ressalta que as penas “aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime”, diz o texto.
Já o artigo 213, que prevê o crime de estupro, considera que “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” tenha uma pena de deis a dez anos de reclusão. Caso a vítima seja menor de 18 anos e maior de 14, como o caso da vítima de 15 anos, a pena pode ser de até 12 anos.
Sem retorno
O BHAZ tentou contato por diversas vezes com o Clube Progresso. Em algumas ligações, os funcionários se mostraram surpresos com as acusações contra o treinador de futebol do clube. Contudo, nenhum responsável foi encontrado no local para responder aos questionamentos da equipe.
A reportagem também conversou com o diretor do clube, mas o homem evitou responder à demanda e não foi mais possível localizá-lo. Um outro sócio do clube, que preferiu não se identificar, disse que o presidente e porta-voz da agremiação está incomunicável. “Ele não responde e não atende a ninguém. Também queremos saber o que está acontecendo”, disse o interlocutor. A matéria será atualizada caso o clube se manifeste.