O papa Francisco promulgou uma resolução que abole o “segredo pontifício” em casos de pedofilia cometidos por membros do clero.
Assinada pelo secretário de Estado do Vaticano, cardeal Pietro Parolin, a medida é resultado de um “Rescriptum ex audientia”, espécie de diretriz escrita a partir de instruções transmitidas via oral pelo Pontífice, e tem como tema a “confidencialidade dos casos”.
O artigo primeiro do texto estabelece que denúncias, processos e decisões relacionados a abusos sexuais contra menores de idade não são cobertos pelo segredo pontifício.
A mudança é efeito da cúpula realizada no Vaticano em fevereiro para discutir os escândalos de pedofilia na Igreja Católica. Após a conferência, Francisco prometeu mais transparência no combate aos abusos contra menores e estabeleceu a obrigatoriedade de denúncia para todos os tipos de crime sexual.
A nova instrução também determina que a exclusão do segredo pontifício será válida inclusive quando a pedofilia estiver ligada a “outros delitos”. Apesar disso, o documento afirma que as informações relativas a esses casos devem ser tratadas “de modo a garantir sua segurança, integridade e confidencialidade, a fim de tutelar a boa fama, a imagem e a esfera privada de todas as pessoas envolvidas”.
Segundo a instrução, no entanto, isso não “impede o cumprimento de obrigações estabelecidas pelas leis”, incluindo a “execução de pedidos feitos pelas autoridades judiciárias civis”. “A quem faz a denúncia, à pessoa que diz ter sido ofendida e às testemunhas não pode ser imposto qualquer vínculo de silêncio em relação aos fatos em causa”, diz o texto.
O segredo pontifício é o mais alto grau de sigilo no direito canônico e sua violação é considerada um grave pecado, podendo ser punida até com a excomunhão em casos mais extremos. Além disso, o Papa estabeleceu que o crime de pornografia infantil é caracterizado por imagens de jovens de até 18 anos, e não mais 14, como era até então.
Imagem arranhada
Recorrentes escândalos de pedofilia abalaram a imagem da Igreja Católica em diversos países, como Argentina, Austrália, Chile, Estados Unidos e Irlanda.
A cúpula de fevereiro, que reuniu bispos do mundo todo, foi a primeira tentativa de Francisco de unificar a resposta da Santa Sé aos casos de abuso contra menores.
“Essa decisão é histórica e chega no momento certo”, disse o secretário-adjunto da Congregação para a Doutrina da Fé, Charles Scicluna, uma das principais autoridades da Igreja no combate à pedofilia.
“Até então, a vítima não podia saber a sentença resultante de sua denúncia porque havia o segredo pontifício. Com a abolição, os documentos não passam a ser de domínio público, mas, por exemplo, fica mais fácil a possibilidade de uma colaboração mais concreta com o Estado”, acrescentou.