A partir de novembro, o Sistema de Pagamento Instantâneo (SPI), hoje em fase de implantação pelo Banco Central, promete revolucionar as transações de dinheiro e reduzir custos em relação às TEDs (Transferências Eletrônicas Disponíveis) e DOCs (Documentos de Crédito) disponíveis no mercado.
Com um simples smartphone, qualquer pessoa poderá realizar transferências de valores a qualquer hora do dia, a baixo valor e com o dinheiro sendo depositado para o interessado, em dez segundos.
A expectativa é de que o sistema dispense de maneira crescente o uso de cartões e de caixas eletrônicos. Utilizando um QR Code, um smartphone emite o pagamento, por aplicativo, e outro lê e concretiza a transferência.
Implantado hoje em 54 países, o novo sistema vem para facilitar a vida, principalmente dos pequenos empreendedores. O SPI vai permitir que as pessoas diminuam, por exemplo, os gastos com aluguel ou compra de maquininhas de cartão.
Testes
O BC iniciará o período de testes em março. Uma realidade que já existe dentro de sistemas como Pic Pay e Nubank passará a ser obrigatória no país e promoverá intercâmbio de transações entre as instituições financeiras.
O lançamento ocorrerá no penúltimo mês de 2020, e a previsão é de que o sistema esteja funcionando em sua integralidade até 2023. Todos os bancos licenciados pelo BC deverão oferecer a ferramenta. Em função disso, a autarquia montou um grupo de trabalho em 2018 e, desde o ano passado, o Fórum do Pagamento Instantâneo (FPI), envolvendo governo e instituições como bancos, fintechs e escritórios de advocacia, se reúne a cada 45 dias em Brasília e São Paulo.
Uma plenária está agendada na capital paulista para os dias 17 e 18 deste mês, quando os testes devem ser anunciados. “A estimativa é ver os primeiros testes em 2020, com o pagamento instantâneo entre as pessoas físicas e, ao longo do tempo, esse processo deve se ampliar entre empresas e governo”, diz Leandro Vilain, diretor de Negócios e Operações da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
“A preocupação neste momento é identificar quem criará as melhores experiências para o usuário e assim conseguir aderência do brasileiro, mudando os hábitos culturais de lidar com o dinheiro”, diz Pablo Silva, sócio da fintech Vindi e um dos integrantes do FPI.
Ele cita o exemplo das plataformas Alipay e WeChat, da China. “Lá, eles praticamente pularam a etapa do cartão de crédito e hoje esses serviços funcionam de forma bastante orgânica. O Alipay tem 1 bilhão de usuário ativos por dia e o WeChat, 800 milhões”.
Adaptar-se às novas ferramentas não deve ser problema para os brasileiros, segundo o professor de finanças Paulo Vieira. “Nosso sistema financeiro já é muito complexo e sofisticado. Por conta dos anos de inflação, tivemos que desenvolver instrumentos ágeis em função disso”, disse.
Segurança
A substituição dos DOCs e TEDs pela nova tecnologia traz, contudo, a necessidade de suporte para evitar fraudes. “Não são riscos novos para a autoridade monetária, a supervisão apenas se intensificará com a adoção de um novo sistema”, diz Igor Fonseca, advogado da área de direito bancário do escritório da Ferreira Cardoso & Teixeira Advogados e Consultores.
Impacto em cartões e maquininhas e maior educação financeira
Uma das previsões a partir do SPI é que os cartões e máquinas de débito possam se tornar obsoletos. A dimensão de tal impacto, porém, é relativizada por Percival Jatobá, coordenador do Comitê de Transformação Digital da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs).
“Não é isso o que vemos em lugares onde já foram implementados. A mentalidade do cartão de crédito foi aceita. Pode existir uma sobreposição em relação ao cartão de débito. Quem vai decidir isso é o consumidor”, pontua Jatobá, que destaca as diferenças.
“A entrada dos SPI é benéfica para o consumidor brasileiro, que deseja ter mais uma forma de transferência eletrônica. Se você quiser fazer uma compra ou uma transação com foco em agilidade vai por um caminho do SPI, mas se quiser parcelar e trabalhar melhor a engenharia financeira, recorre ao crediário”, explica.
Além disso, o dinheiro em espécie também perde um pouco de seu papel, reduzindo custos com a fabricação de moeda ($ 800 milhões no país, em 2017) e aqueles relativos à falsificação (R$ 36 milhões perdidos, no mesmo período). Outro objetivo é o de democratizar o acesso aos sistemas bancários.
“ Hoje, há 45 milhões de brasileiros desbancarizados e o objetivo é democratizar o ambiente financeiro do país, dar acesso a quem não tem”, ressalta Pablo Silva, sócio da Vindi, lembrando que há hoje no Brasil uma proporção de dois brasileiros para cada três smartphones. Por consequência, a ferramenta também contribuirá para a educação financeira no Brasil.
“A ampliação da cidadania financeira dará condições para que o brasileiro possa ter acesso ao sistema bancário, investimentos e facilidade de pagamentos”, completa Vinicius de Castro Scotta dos Passos, coordenador do MBA Executivo em mercado de capitais e derivativos da PUC Minas.