Muito se falou nos últimos dias sobre a reportagem apresentada na Rede Globo de Televisão (Programa Fantástico) no dia 08/03/2020 que abordou a realidade de pessoas transexuais que cumprem pena de prisão em nosso país.
No centro da questão estava uma pessoa que se tornou um dos personagens mais queridos da televisão atual: Dr. Drauzio Varella. Por sua competência profissional, trabalhos voluntários e forma simples de falar sobre situações complexas ele se tornou uma pessoa admirada. Ademais, todos os domingos ele “visita” as casas dos brasileiros por meio de matérias jornalísticas. Dessa forma, foi criada uma verdadeira relação imaginária de proximidade entre os telespectadores e o Doutor. Ele acabou por ser conhecido como “médico da família” brasileira.
Também no centro da questão estavam pessoas que participaram de um processo judicial criminal e que foram condenadas. E que, por isso, cumprem penas por crimes cometidos. Pessoas estas que, por acaso, se verificam como transexuais.
Como cantou Gonzaguinha: Primeiro você me alucina / Me entorta a cabeça / E me bota na boca um gosto amargo de fel.
A reportagem foi alvo de grande comoção nacional. Porém, não pelo tratamento humano apresentado pelo Dr. Drauzio aos transexuais apenados que foram abandonados por suas famílias e ‘amigos’ diante do cárcere. O “fel” foi o fato de que o abandono dessas pessoas no sistema carcerário não se vincula ao fato de ser ou não transexual, mas sim aos crimes cometidos por estas pessoas e seu comportamento no passado.
Na reportagem em tela o Dr. Drauzio não realizou atividade médica. Ele agiu como jornalista. Como tal, ele e toda equipe da Rede Globo de Televisão envolvida neste trabalho, deveriam ter se pautado pela cautela e cuidados necessários à apuração dos fatos e apresentá-los de forma imparcial.
Na verdade, foi muito pior. As informações foram devidamente apuradas, porém não foram apresentadas como devido para o público. Os profissionais envolvidos naquela reportagem tinham plena ciência dos crimes que foram praticados pelas pessoas apenadas. No entanto, preferiram esconder essas informações em prol de uma comoção pública (que seria fatalmente perdida se fossem revelados os crimes praticados). Como diriam os antigos: o tiro saiu pela culatra.
Gonzaguinha continua cantando: As pedras cortando e eu vou perguntando / “Até quando?”
Hoje, o Dr. Drauzio continua sendo uma pessoa querida. Não tanto quanto antes, mas ainda muito querida (por seus méritos pessoais). Acredita-se que também foi vítima da situação.
Hoje, a Rede Globo de Televisão continua sendo a maior empresa do ramo. Passou a ser ainda mais questionada por seus atos e continua sendo formada por algumas pessoas (que aparentemente se utilizam de outras pessoas ardilosamente) para alcançar seus objetivos.
Hoje, as pessoas transexuais que cumprem pena em nosso país são verdadeiramente abandonadas por seus familiares e ‘amigos’. Seja em virtude de suas características pessoais… seja em razão dos crimes cometidos.
Hoje, as pessoas que compõe famílias das vítimas continuam suas vidas com a marca do crime sofrido.
Hoje, todos nós… e todos aqueles acima citados, continuamos sendo pessoas.
É Gonzaguinha… “Veja bem / É o amor agitando o meu coração / Há um lado carente dizendo que sim / E essa vida da gente gritando que não.”
A nossa realidade atual nos proporciona um caminho muito fácil (porém perigoso): ódio. E este caminho é trilhado em nossas imperfeições. Por isso, a palavra principal deste texto é: pessoas. Proposital e exaustivamente repetida.
Pessoas… todos somos. Todos somos falhos. Todos estamos sujeitos a erros. Todos podemos melhorar… como pessoas.