* Por O Tempo
Um a cada três pacientes internados com Covid-19 em hospitais públicos e filantrópicos de Minas Gerais não resiste à doença. Levantamento inédito realizado por O TEMPO com dados do Ministério da Saúde revela que o risco de morte nesses locais é 52% maior na comparação com as instituições da rede privada.
Em média, 32% dos mineiros que dão entrada em unidades públicas e 31% dos ingressados em entidades sem fins lucrativos não sobrevivem à Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) provocada pelo novo coronavírus. Nas instalações particulares, esse índice cai para 21%, isto é, um óbito a cada cinco internações notificadas.
De acordo com especialistas, a disparidade não se deve apenas aos recursos materiais e humanos empregados no atendimento. A diferença também precisa ser analisada sob a ótica da desigualdade socioeconômica e seus efeitos no histórico de saúde das vítimas.
A costureira Marizete Pereira, 42, relaciona as condições financeiras da família ao caso do marido, Nilson, que trabalhava como motorista por aplicativos. Ele morreu aos 45 anos, depois de dez dias internado em um hospital público de Belo Horizonte. Segundo a autônoma, a vítima continuou na ativa por quase uma semana após os primeiros sintomas, confundidos inicialmente com uma sinusite, até ter um pico febril e ser hospitalizada.
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“Ele estava muito preocupado com as contas. Se não fosse isso, talvez tivesse se afastado do trabalho. Motoristas ficam muito expostos. Ele já tinha pegado passageiro que chegava de máscara e, quando olhava pelo retrovisor, a pessoa já tinha tirado. Também pegou pessoas alcoolizadas, indo para festas clandestinas”, conta a viúva.
O menor acesso aos diagnósticos, as piores condições de saneamento, alimentação e controle de doenças crônicas, a impossibilidade de trabalhar remotamente e a necessidade de utilizar o transporte coletivo são exemplos de fatores sociais relacionados ao desequilíbrio nos números.
Ainda que hospitais públicos contem com trabalhadores competentes e tenham expandido e qualificado seus leitos, os pacientes geralmente apresentam condições mais precárias do que aqueles assistidos por serviços particulares, como destaca a coordenadora do Observatório de Saúde Urbana da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Waleska Caiaffa.
“O que vemos é um efeito das desigualdades. Não é que os hospitais sejam ruins. Eles são o reflexo do que está lá fora. A pandemia descortinou uma situação que já era conhecida, mas ficou ainda mais visível”, avalia a médica e professora especialista em epidemiologia e saúde pública.
Além disso, a pesquisadora cogita que parte da população mais pobre possa apresentar comorbidades que sequer foram diagnosticadas adequadamente ao longo da vida e representam um fator de risco frente à Covid-19.
Governo lembra que ampliou oferta de leitos no Estado
Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde destacou que ações de prevenção e mobilização foram iniciadas antes mesmo do primeiro caso de Covid-19 confirmado em Minas Gerais no dia 8 de março. Entre elas estão a criação do Centro de Operações de Emergência em Saúde (Coes) e o programa Minas Consciente.
Segundo a pasta, a oferta de leitos foi ampliada em 90% nas UTIs (de 2.072 para 3.957) e 80% nas enfermarias (de 11.625 para 20.987). Esses números incluem equipamentos privados contratados via convênio.
“Todas as macrorregiões tiveram incremento. A Norte, por exemplo, dobrou sua capacidade assistencial, passando de 121 leitos para os atuais 253. A macrorregião Leste do Sul tinha um déficit de 43 leitos de UTI e, a partir da estratégia do governo, chegou aos 122”, ressalta a secretaria.
Ainda de acordo com a SES, já foram repassados aos municípios, hospitais e unidades de saúde R$ 2,1 bilhões em recursos estaduais, “com o objetivo de potencializar a prestação de serviços”.