O iPhone completou 15 anos neste domingo (9). O smartphone e principal produto da Apple, ainda que abocanhe um market share de apenas 29,24% entre os sistemas móveis, contra 70,01% do Android (dados de dez/2021), ele e o iPad respondem por três quartos dos lucros do setor, deixando Google e suas fabricantes parceiras comendo poeira.
O “iPod and a Phone”, como Steve Jobs o apresentou em janeiro de 2007, foi eleito em 2016 pela revista TIME “o gadget mais influente da história”, tanto por quebrar o paradigma do que um telefone celular poderia ser, quanto por mudar completamente a telefonia móvel e as formas de se consumir conteúdo.
Vamos dar uma olhada em como o iPhone veio a ser e por que ele foi tão revolucionário, embora muitos discordem, mas não tenham como desmentir o fato.
No princípio havia… o Newton MessagePad
Oficialmente, o desenvolvimento tanto do iPhone quanto do iPad começou em 2004, quando Steve Jobs colocou quase a mesma equipe do iPod, sendo o engenheiro Tony Fadell, o ex-SVP de Design Jony Ive e o VP de Marketing Phil Schiller, para trabalharem com o ex-VP de Software Scott Forstall e o SVP de Serviços Eddy Cue, em um empreendimento secreto conhecido como “Project Purple”.
Haviam dois times distintos, para trabalharem nos respectivos produtos em paralelo, mas justiça seja feita, o embrião do iPad era mais antigo: em 1991, quando Ive entrou para a companhia, ele apresentou um projeto chamado “Macintosh Folio”, que seria um tablet para ser operado com uma caneta stylus.
Dois anos depois, a Apple introduziu no mercado o Newton MessagePad, uma variante dos PDAs da maçã que era quase que completamente desprovido de botões. Jobs teria vislumbrado neste design, ainda que o produto original não tenha sido popular, a chave para permitir a Apple revolucionar a telefonia celular.
Jony Ive proveria uma solução, tanto para o iPhone quanto para o iPad, em que o usuário navegaria sem depender de botões, tocando e movendo os dedos diretamente sobre a tela touch, visto que a stylus também não seria uma opção elegante para o então CEO.
Inicialmente, Jobs não queria entrar nesse mercado, mas em 2002, depois de lançar o iPod, ele entendeu que não teria como evitar a mudança. Em 2004, celulares começaram a embarcar recursos dos players de música digitais, e era preciso garantir um meio de manter a Apple à frente da concorrência.
Para Jobs, introduzir um celular sem botões era essencial para atrair a atenção do público, e para distanciar o seu produto do que todos entendiam como o smartphone ideal, que eram os modelos da RIM, posteriormente BlackBerry. Então sinônimos de computadores de bolso funcionais, eles contavam com teclado físico e a tela era normal, sem touch.
Mais importante, os smartphones BlackBerry eram produtos com forte apelo ao usuário corporativo, o símbolo de status do homem de negócios bem-sucedido. Jobs, por outro lado, queria que o iPhone fosse adotado por todo mundo.
Jobs, Ive, Fadell e cia. definiram o iPhone como um iPod com telefone, abarcando todas as soluções do player de música, com o acesso à iTunes Store garantido via redes móveis, Wi-Fi e/ou cabo, ligado a um Mac ou PC. Novas tecnologias, como melhores baterias de íons de lítio, menores e mais eficientes, a evolução de displays multi-touch, melhores processadores ARM, redes móveis mais potentes e em expansão, e melhorias na navegação móvel (céus, ninguém merece o WAP), privilegiaram bastante o desenvolvimento do gadget.
Assim, o iPhone seria um computador de bolso realmente poderoso, fácil de usar, intuitivo, com grande eficiência energética, com acesso ao iTunes e relativamente acessível. Por fim, Jobs bateu o pé com as operadoras e garantiu que todas as atualizações de sistema seriam geridas pela Apple, nenhum bloatware viria pré-instalado, e nenhum recurso seria capado mediante contrato de planos específicos.
Com o iPhone, as pedradas
Quando o iPhone foi apresentado durante o keynote da MacWorld 2007, Steve Jobs sabia muito bem o que aconteceria a seguir. Em um primeiro momento, todo mundo desceu o malho no produto, que esteticamente era muito parecido com o iPod Touch, principalmente por contar com conectividade apenas 2G/EDGE, em uma época em que o 3G já estava bem difundido.
A Apple no início focou em fazer o produto se conectar a qualquer rede já estabelecida, e verdade seja dita, a primeira geração era bem limitada, pois não possuía… apps. A App Store só seria introduzida em 2008, junto com o iPhone 3G, a segunda geração do gadget.
O único app de terceiros incluído no iPhone 2G era o do YouTube, que sequer era apresentado com o ícone padrão; ao invés disso, a Apple o ligou à imagem de uma TV velha, com todo o esqueumorfismo provido por Scott Forstall, por imposição de Jobs, este defensor do estilo visual; após sua morte e a partida de Forstall da empresa, o design flat, ao qual Jony Ive era mais favorável, se tornou dominante.
A RIM pagou muito caro não apenas por não considerar que o iPhone ganharia espaço entre usuários corporativos, mas também pela colossal arrogância de seus CEOs, desde o co-fundador da empresa Jim Balsillie dizer que “as pessoas vão às lojas atrás do iPhone e saem com um BlackBerry”, e que “a qualidade das ligações é precária”, a Mike Lazaridis dizer em 2008, que o grande diferencial de seu produto era o teclado QWERTY.
E claro, teve a antológica declaração de Steve Ballmer, o então CEO da Microsoft, que na época promovia seus celulares com Windows Mobile 6.0 e os players de música Zune:
De fato, US$ 499 por um celular apenas 2G parecia um absurdo, mas Steve Jobs já havia demonstrado, vez após outra, que convencer mercados inteiros a aceitarem a sua visão era um de seus passatempos favoritos, e suas ideias quase sempre colavam.
Para desespero de todo mundo, entre o lançamento oficial nas lojas no dia 29 de junho de 2007, e o fim da disponibilidade oficial em 15 de julho de 2008, o iPhone 2G vendeu 6.124.000 unidades; o iPhone 3G, 1 milhão de unidades no primeiro fim de semana.
O segundo modelo introduziu os apps e a Apple App Store, onde usuários podem adquirir aplicações das mais diversas, de lazer e consumo de conteúdo, como jogos e serviços de streaming, a ferramentas de produtividade, que o iPhone sempre deu conta apesar da tela diminuta; o conceito de computador de bolso completo, ainda um tanto alienígena, foi algo que os concorrentes tiveram que correr atrás para equiparar seus produtos à maçã.
Android volta para a prancheta
O Google também foi duramente impactado pela apresentação do iPhone, isso porque na época, a companhia já estava com o desenvolvimento do Android bem adiantado. Andy Rubin, que originalmente desenvolveu um sistema para ser usado em câmeras digitais, teve sua companhia Android Inc. adquirida pela gigante das buscas, e o projeto movido para telefonia móvel.
Rubin e sua equipe estavam trabalhando em algo que era essencialmente um BlackBerry do Google, sem tela touch e totalmente dependente de um teclado físico. Segundo relatos, Rubin disse após assistir o keynote que o Google “não mais iria lançar aquele telefone”, e de fato, o projeto foi para o lixo e recomeçou praticamente do zero.
O HTC Dream, o primeiro celular lançado rodando Android, só deu as caras em setembro de 2008, quando o iPhone 3G já estava mais do que estabelecido; o Google no entanto, preferiu fechar parcerias com diversas fabricantes, a fim de que estas lançassem produtos dos mais diversos modelos, para vários públicos e de categorias consumidoras diferentes.
Os primeiros produtos considerados premium a rodar Android, e que tiveram grande apelo junto ao público, foram o Motorola DROID/Milestone (2009), que ainda contava com um teclado QWERTY, e o Galaxy S (2010), este bem mais próximo do iPhone, ao ponto de render uma guerra judicial entre a Apple e a Samsung, que se arrastou por anos, que incluiu versões subsequentes de ambas marcas na pendenga.
Hoje, o Android responde por 70% do market share da telefonia móvel, dividido entre todas as marcas que trabalham com o sistema, mas a grande parte dos lucros do setor está concentrado nas mãos da Apple, com o iPhone sendo o seu principal produto.
No mais, iniciativas de outras empresas tentando se tornar a terceira via, como a Microsoft (que se sabotou sozinha, mais de uma vez), Firefox e outras, não deram em nada; já a RIM foi derrubada do topo, mudou de nome para BlackBerry, tentou se reestruturar, mas não teve jeito.
iPhone hoje
A Apple não mais divulga o número exato das vendas de seus produtos; em janeiro de 2021, o CEO Tim Cook se limitou a dizer que existiam 1 bilhão de iPhones ativos em todo o mundo, enquanto que o Google afirmou, em agosto do mesmo ano, que o Android alcançou a marca 2,5 bilhões de aparelhos funcionais.
Tirando o Brasil, que não é parâmetro para nada, o iPhone começa com preços relativamente acessíveis, sendo de US$ 399 para o modelo SE; a geração do ano corrente, com recursos mais recentes, é normalmente mais cara, chegando a valores que ultrapassam a casa dos US$ 1 mil, o que sendo justo, não é muito diferente com aparelhos Android premium; em alguns casos, estes são bem mais caros.
De qualquer forma, a introdução do iPhone no mercado 15 anos atrás mudou para sempre a telefonia celular, que evoluiu de aparelhos estritamente para falar para computadores completos, a nossa relação com consumo de conteúdo e como nos comunicamos com as pessoas.
Além disso, o iPhone e os celulares Android permitiram que muitos desenvolvedores pudessem lucrar com seus softwares, ainda que Apple e Google não abram mão de suas fatias do bolo, que vêm sendo questionadas por serem grandes demais.(Meio Bit)