Um time de cirurgiões da Universidade do Alabama em Birmingham demonstraram que é possível usar órgãos de porco, geneticamente modificados, como uma opção para transplantes em humanos. Uma recente pesquisa, publicada nos Estados Unidos, relata o caso de um paciente com morte cerebral que recebeu dois rins suínos, que funcionaram normalmente por 3 dias.
O caso nem é inédito: em setembro de 2021, um time ligado à Universidade de Maryland transplantou com sucesso o coração de um porco para um senhor de 57 que sofria de uma doença congênita; ele está vivo e vem sendo monitorado desde então.
Pesquisas no ramo de xenotransplantes (entre espécies) não são novas, o caso mais antigo da literatura médica é o de uma criança francesa que em 1905, recebeu fragmentos dos rins de um coelho, mas tanto nesta ocorrência quanto em outras posteriores, os pacientes acabam vindo a óbito por uma série de fatores, ligados à rejeição do organismo a elementos estranhos, levando a infecções agudas, necrose e falência múltipla.
Os estudos mais recentes, que estudam a viabilidade de órgãos doados por outros animais, gira em torno da manipulação genética de embriões. É uma forma de desenvolver espécimes com um tipo muito específico de quimerismo, em que seus órgãos carregam traços genéticos do DNA humano, a fim de eliminar, ou pelo menos reduzir drasticamente, os índices de rejeição.
No primeiro caso, o procedimento realizado pela Universidade de Alabama, foram usados rins de porcos que receberam, ainda na fase embrionária, 10 tipos de modificações genéticas com material humano, incluindo 2 genes inibidores complementares (hDAF e hCD46), 2 genes anticoagulantes (hTBM e hEPCR) e 2 genes inumo-modulatórios (hCD47 e hHO1), além da remoção de 3 antígenos de carboidratos próprios do porco e do gene receptor do hormônio de crescimento suíno.
Uma vantagem é o fato de que os porcos alterados não expressavam antígenos sanguíneos; logo, todos eram doadores universais por padrão.
O paciente submetido ao transplante de rins foi um paciente que teve morte cerebral confirmada, chamado James Parsons, e o procedimento foi conduzido com autorização da família. Os rins do indivíduo foram substituídos pelos suínos com genes humanos, e segundo o artigo publicado, os órgãos começaram a trabalhar e produzir urina normalmente, 23 minutos após serem ligados ao corpo do paciente.
O experimento foi conduzido por pouco mais de 72 horas, e análises posteriores constataram que os rins transplantados não apresentavam nenhum tipo de rejeição por parte do corpo humano; ao menos em uma janela de curto espaço de tempo, eles funcionaram como órgãos humanos normais.
Este não é o único caso de transplante de órgãos porcinos modificados bem sucedidos, e nem é o mais impressionante. Em dezembro de 2021, uma outra equipe conduziu um experimento similar, com um paciente também em estado de morte cerebral, em que o rim foi ligado aos vasos sanguíneos da perna, mas deixado do lado de fora do corpo. Ainda assim, ele funcionou normalmente por 54 horas, o tempo que a experiência durou.
Pouco tempo antes, em setembro, um time de cirurgiões da Escola de Medicina da Universidade de Maryland conduziu o que está sendo tratado como o caso mais surpreendente: divulgado recentemente, um paciente com um quadro de arritmia fatal recebeu um coração de porco com genes humanos, a fim de salvar sua vida.
O paciente, um homem de 57 anos chamado David Bennett, vem sendo monitorado desde então e para todos os fins, está perfeitamente bem com um coração de porco no peito. O caso virou polêmica por outros motivos, visto que o receptor foi condenado por esfaquear outro homem em 1988, deixando-o paraplégico.
Segundo a irmã da vítima, que morreu em 2007, Bennett não merecia ser salvo, mas a equipe da Universidade de Maryland rebateu, dizendo ao The New York Times que o histórico criminal de um paciente não deve usado como critério para garantir ou negar tratamento. Claro que há casos e casos, ainda mais nos EUA.
Controvérsias à parte, segundo o Dr. Jayme Locke, líder da pesquisa e procedimento com os rins de porco, o uso de técnicas de xenotransplante são a última alternativa em um cenário desesperado, uma opção para reduzir as filas de espera de pacientes não só nos EUA, mas em todo o mundo, e não deve ser considerada como uma via normal, mas ao menos nos casos de falência renal, é uma alternativa a ser considerada para solucionar um quadro de alto risco.
Pode ser que no futuro, transplantes com órgãos de porco se tornem uma solução intermediária, não destinada a um quadro permanente, de modo a garantir um período de sobrevida enquanto um paciente espera por um doador humano compatível; por outro lado, seria no mínimo interessante, se daqui a 30 ou 50 anos, o uso de órgãos daqueles que nos deram tanto, do bacon à feijoada, se torne algo completamente mundano e comum, caso ainda não tenhamos chegado aos órgãos artificiais permanentes. (Meio Bit)