A aposentada Conceição Moreno, 60, só descobriu que teve Covid-19 por causa de uma dor de cabeça persistente. Ela conta que, a partir de outubro de 2020, as dores se prolongaram por 50 dias seguidos. Por isso, procurou um médico, que suspeitou de Covid longa.
A condição, que também vem sendo chamada de Covid persistente, Síndrome Pós-Covid ou Covid pós-aguda, é caracterizada por sintomas e complicações em longo prazo que se manifestam para além de quatro semanas desde o início dos sinais da infecção pelo coronavírus – e podem se arrastar por meses.
No caso de Conceição, os sintomas da Covid-19 propriamente ditos nem foram notados. Após a suspeita do médico, ela fez um exame de sorologia, que detectou a presença de anticorpos produzidos contra o vírus. A suspeita foi confirmada não só pelas dores de cabeça, mas também pelos sintomas que se seguiram e permanecem até hoje.
A aposentada se queixa de frequentes lapsos de memória. “Se antes eu organizava o pagamento das contas de casa de cabeça, hoje preciso anotar tudo na agenda do celular”, afirma. Conceição também precisou tratar uma depressão severa. “Comecei a sentir uma angústia profunda. Não queria sair do quarto, chorava a todo momento, tinha insônia frequentemente. Nem me alimentar conseguia mais, tanto que perdi 5 kg em poucos dias.”
Sequelas neurológicas e psiquiátricas têm figurado no ranking de queixas comuns entre pacientes afetados pela Covid-19, segundo publicações científicas recentes. O médico psiquiatra Rodolfo Damiano, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, cita um trabalho com sobreviventes de Covid-19 um mês após a alta hospitalar, que relatou altas taxas de problemas ligados à saúde mental, como depressão, transtorno de ansiedade, transtorno do estresse pós-traumático, insônia e sintomas obsessivo-compulsivos diretamente relacionados à infecção pelo vírus.
As doenças neurológicas são aquelas que afetam o cérebro, a medula espinhal ou os nervos, levando a sintomas que podem abranger parte do sistema nervoso ou sua totalidade. Entram na lista todas as formas de dor (como cefaleia e dor nas costas), fraqueza nos músculos, perturbação nos sentidos (visão, paladar, olfato e audição), falta de coordenação, dormência e até acidente vascular cerebral (AVC).
Já os transtornos psiquiátricos envolvem uma grande variedade de condições que afetam o humor, o raciocínio e o comportamento. Dentre os distúrbios mais conhecidos estão a depressão, o transtorno de ansiedade, o estresse pós-traumático e o transtorno bipolar.
Os transtornos psiquiátricos podem tanto agravar quanto desencadear os transtornos neurológicos — e vice-versa. Apesar disso, os dois problemas não necessariamente estão conectados.
Memória e dor
A perda de memória relatada por Conceição também é uma reclamação frequente de pacientes que tiveram Covid-19, de acordo com o neurologista Diogo Haddad, coordenador do Núcleo da Memória do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e chefe do Serviço de Neurologia Comportamental da Santa Casa de São Paulo.
“A procura por atendimento neurológico cresceu entre pacientes que tiveram Covid-19, que comumente chegam com quadros de dor de cabeça, dificuldade para organizar o pensamento, tontura, vertigem e outros sintomas”, diz.
De acordo com um amplo estudo realizado a partir da análise do prontuário eletrônico de mais de 230 mil pessoas diagnosticadas com Covid-19 nos EUA, 1 em cada 3 pacientes recuperados pela doença apresenta alguma sequela neurológica ou psiquiátrica.
Dentre as queixas neurológicas mais comuns, apareceram lapsos de memória, fadiga e dor de cabeça. O levantamento foi realizado a partir de um artigo publicado recentemente pela revista científica Annals of Clinical and Translational Neurology, que avaliou sintomas neurológicos persistentes e disfunção cognitiva em pacientes não-hospitalizados acometidos pela Covid-19.
Fonte: CNN BRASIL