Há reconhecimentos que custam a chegar. No caso de Antonieta de Barros (1901-1952), o título universitário foi concedido quase 70 anos após a sua morte — para ativistas, uma reparação histórica. Em dezembro, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) passou a considerá-la doutora honoris causa, in memoriam.
Mulher negra atuante em um contexto de segregação racial e pouco espaço para o ativismo feminino, Antonieta de Barros não se limitou a uma só atividade. Foi jornalista, escritora, educadora, militante política.
“Trazer o legado de uma mulher negra como Antonieta e torná-la doutora honoris causa na UFSC significa recontar parte da luta das mulheres negras neste estado ainda tão racista, sexista e conservador”, afirma a educadora Joana Célia dos Passos, professora na universidade. “Significa questionar a narrativa de que Santa Catarina se fez hegemonicamente pelo trabalho dos imigrantes europeus.”
“Antonieta de Barros tem importância fundamental na memória política, cultural e histórica de Santa Catarina”, avalia Eliane Debus, professora no Departamento de Metodologia de Ensino do Centro de Educação da UFSC e autora do livro infantil Antonieta, que conta a trajetória da educadora. “Não estamos falando de resgate [histórico]. Aqui vale a palavra ‘construção’. Construção de uma história para não se perder na memória.”
Nascida em Florianópolis, Antonieta era filha de uma lavadeira, escrava liberta, com um homem sobre quem pouco se sabe — pode ter sido funcionário dos correios e músico, conforme diz a pesquisadora Jeruse Romão em seu livro Antonieta de Barros: professora, escritora, jornalista, primeira deputada catarinense e negra do Brasil.
Viúva quando a menina ainda era criança, sua mãe alugava cômodos para estudantes para garantir o sustento. E foi assim que Antonieta acabou se alfabetizando. De acordo com o dossiê apresentado à UFSC como justificativa para a homenagem recém-realizada, ela “sentiu em sua infância e juventude o que significava ser mulher negra e pobre, num estado do sul do Brasil, majoritariamente branco e com forte adesão à eugenia como política social”.
Logo, tornou-se ela própria uma militante pela educação, entendendo que só com acesso aos estudos as minorias poderiam experimentar alguma ascensão social. (Revista Planeta)