Às moscas. Assim ficou o plenário na maioria das sessões na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) durante 2017. De acordo com levantamento feito pelo Jornal O Tempo, das 106 sessões ordinárias que ocorreram no ano passado no plenário da Casa, somente seis resultaram em votações de projetos. Outras 19 reuniões que deveriam ter sido realizadas nos últimos 12 meses nem mesmo foram abertas por falta de quórum. Mesmo com essa falta de produtividade, os deputados estaduais acabam custando, e muito, aos bolsos dos contribuintes mineiros.
Cada um dos 77 parlamentares tem direito, mensalmente, à remuneração de R$ 25.322,25, à verba indenizatória no valor de até R$ 27 mil e a outros R$ 4.377,73 de auxílio-moradia. Mensalmente, cerca de R$ 4,365 milhões dos cofres públicos são utilizados para arcar com esses benefícios para os políticos. A título de comparação, essa quantia seria suficiente para pagar, por mês, os salários mínimos de 4.576 trabalhadores, que, diferentemente dos políticos, não podem deixar de cumprir com suas obrigações. Caso contrário, têm parte da remuneração descontada.
Destinadas à discussão e a votações de projetos de interesse dos cidadãos, as reuniões ordinárias são aquelas previamente marcadas e que os deputados sabem, desde o início da legislatura, que vão ocorrer: sempre acontecem às 14h das terças, quartas e quintas-feiras. No entanto, a impressão é a de que a maioria dos parlamentares esquece, com frequência, de conferir a agenda.
Isso porque, para se votar um texto na Casa, é necessária a presença de, pelo menos, 39 dos 77 deputados estaduais. Já em casos de Propostas de Emenda à Constituição (PECs) em pauta, é preciso que 48 políticos estejam no plenário. Porém, o que se viu no ano passado foi que esse quórum qualificado não existiu em 94% das reuniões ordinárias.
O levantamento aponta ainda que, em 2017, somente 36 propostas foram apreciadas nas seis sessões ordinárias que resultaram em votações de matérias na Assembleia, sendo que apenas três delas foram analisadas em segundo turno na Casa. Para se ter uma ideia do ritmo lento do Legislativo durante o ano passado, no mês de julho um projeto foi aprovado e, somente quatro meses depois, com a chegada das festas de fim ano, os políticos resolveram apreciar, em cinco reuniões de dezembro, outras proposições no plenário da ALMG.
A pesquisa da reportagem mostra também que, em 2017, a maioria das votações no plenário da Assembleia ocorreu durante sessões extraordinárias, que são convocadas em horários e dias diversos. Antigamente, os deputados recebiam por participar desse tipo de reunião, mas o penduricalho foi extinto em 2012. Porém, a prática parece ter permanecido na Casa.
Conforme o levantamento, no ano passado, foram realizados 23 encontros extraordinários, sendo que 19 deles resultaram na apreciação de nove vetos e de 182 projetos – 82 dessas proposições foram votadas em primeiro e em segundo turno.
Anteriormente
Em 2016, o cenário não foi muito diferente na Assembleia de Minas. Das 75 reuniões ordinárias feitas naquele ano, apenas sete delas resultaram em votações de proposições, o que revela que, em 91% do tempo, os políticos não apreciaram nenhum projeto em plenário. A maioria das votações em 2016 também ocorreu durante encontros extraordinários – foram 30 sessões.
Dados
O jornal O Tempo, realizou o levantamento com base nas atas dos resultados das reuniões ordinárias e extraordinárias disponíveis no portal da Assembleia Legislativa de Minas.
Balanço
A reportagem não levou em conta no cálculo as reuniões em que se votaram requerimentos, uma vez que, conforme o regimento da ALMG, esse tipo de texto é apreciado, na maioria das vezes, de forma simbólica.
Rito
Nesse tipo de votação, o presidente da Casa solicita aos deputados que ocupem seus lugares no plenário e pede para que favoráveis permaneçam assentados.
EXPLICAÇÃO
“Uso do cachimbo entortou a boca”, avalia líder do governo
Os parlamentares apresentaram diversas justificativas para os trabalhos desempenhados em 2017 no plenário da Assembleia. Entre elas está a obstrução feita pela minoria e a insatisfação da base com a falta de liberação de emendas. Mas o líder do governo, Durval Ângelo (PT), deu uma explicação mais pragmática: a tradição. “Antes, tinha uma explicação, pois as sessões extraordinárias eram pagas. Talvez o uso do cachimbo entortou a boca. As reuniões ordinárias passaram a ser de debates políticos, e as extraordinárias, de votação”, disse Durval.
Segundo o vice-líder do bloco de governo Léo Portela (PRB), um dos instrumentos legais previsto no regimento é a obstrução. “A única forma que a minoria tem para fazer com que seus projetos sejam votados – ou que um projeto do governo contrário a seus ideais não passe – é obstruindo. E não é porque a Assembleia não votou que não houve trabalhos. As comissões trabalham normalmente, com votações diárias”, avalia.
O líder do bloco oposicionista, Gustavo Corrêa (DEM), afirma que, às vezes, a imprensa vincula o número de votações à qualidade do serviço. “Nem sempre qualidade é quantidade. Os projetos que foram aprovados são muito importantes para Minas. O trabalho de obstrução é para mostrar aos mineiros que esse governo está equivocado”, disse.
Já Iran Barbosa (PMDB) avalia que o regimento da ALMG é “frágil”. “Um único deputado consegue parar o plenário principal. A Casa se adaptou a essa fraqueza. Ela tramita e discute os projetos durante todo o ano, mas só os pauta quando há consenso entre os deputados. Quando eles entram na pauta, todo mundo já sabe como vai votar porque foram extensamente debatidos nas comissões”, analisa.
Em outra linha, deputados da base revelaram à reportagem que a falta de liberação de emendas é o principal motivo para o “jejum” de votação nas sessões ordinárias. “O parlamento é tocado pelo governo. Quando o governo quer, vota. Quando não quer, não vota”, resume um político.
De acordo com Durval Ângelo, a prioridade do Palácio Tiradentes é normalizar o salário do funcionalismo. Mas ele diz que as emendas indicadas nos Orçamentos de 2016 e de 2017 para as prefeituras, por exemplo, devem ser quitadas neste ano. (O Tempo)