Hoje em Dia
A saúde de uma cinematografia pode ser medida, entre outras maneiras, pela participação em festivais de cinema. No caso da produção mineira, não há nenhuma dorzinha a reclamar, levando-se em conta o retrospecto nos principais festivais do país.
O festival de Brasília, que acontecerá de 14 a 23 de setembro, vem premiando constantemente os mineiros –o principal troféu, o Candango de melhor filme, é “nosso” há dois anos, após as vitórias dos longas “A Cidade Onde Envelheço” (2016), de Marília Rocha, e “Arábia” (2017), de Affonso Uchoa e João Dumans.
Em 2018, os mineiros entram forte no certame brasiliense com três trabalhos: “Bixa Travesty”, de Kiko Goifman e Claudia Priscilla, “Luna”, de Cris Azzi, e “Temporada”, de André Novais Oliveira, que, com a sua produtora Filmes de Plástico, costuma ser pé quente na disputa. Há três anos, o realizador venceu com o curta “Quintal”.
Com “Temporada”, ele põe novamente em cena a cidade de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. No lugar de seus familiares, desta vez se vale de um “olhar estrangeiro” para contar a história de uma mulher de Itaúna que se muda para a periferia de Contagem, onde trabalhará no combate a endemias.
“Nessa nova geografia, passando de casa em casa, ela conhecerá uma outra realidade, por fora e por dentro daquelas moradias”, registra Oliveira, que escalou a atriz e dramaturga premiada Grace Passô para viver a protagonista. “O nome dela partiu de uma observação de Adilson Marcelino, amigo nosso, de que a Grace tem tudo a ver com o trabalho de nossa produtora”.
Além da estreia no Festival de Brasília, Cris Azzi faz, em “Luna”, o seu primeiro longa ficcional, após assinar “Sumidouro” e “O Dia do Galo”. Surpreso com a seleção, ele vive a expectativa de concorrer num festival que “se propõe a ir além da exibição do filme, abrindo espaço para discussões políticas, humanas, poéticas, filosóficas”.
E o conteúdo possivelmente dará bom caldo para esses debates, por tratar de liberdade de escolhas numa era em que as redes sociais se transformaram em barricadas de intolerância, a partir da relação de duas garotas.
“Ainda é muito difícil para mim definir o filme, mas posso dizer que tem a ver com rito de passagem de uma personagem que vai sendo atravessada por esses lugares, de preconceito, de hiperconectividade, de condução ética mediadas pelas novas tecnologias. É a história de uma menina num processo de descoberta de sua identidade, enfrentando as dificuldades colocadas por nossos tempos”, salienta Azzi.
Ficção retrô
Na categoria de curtas, Brasília não deverá ficar imune a “Plano Controle”, que, no campo da ficção, bisa alguns temas do longa “Baronesa” (ganhador da Mostra de Tiradentes no ano passado), da mesma diretora– Juliana Antunes– em especial a discussão sobre a mulher de periferia na sociedade.
“É uma ficção científica que se passa em 2016, ano da primeira fase do golpe no Brasil. Cansada de esperar pelo elevador capenga onde mora, no edifício Maletta, uma mulher descobre que a sua operadora de celular está oferecendo serviço de teletransporte para algumas cidades ícones do mundo. Ela escolhe Nova York, mas acaba indo para o bairro de mesmo nome, em Belo Horizonte, já que o plano só cobre teletransportes dentro de Minas”, detalha Antunes.
Filmado na capital mineira e em Itaúna, o curta foi feito com R$ 20 mil – “Quinze mil de edital e cinco mil de dívidas”, diverte-se Juliana. Por conta dessa limitação orçamentária, o lado futurista de “Plano Controle” tem um lado retrô. “A direção de arte se deu a partir da reorganização do real, como objetos da minha família na zona rural de Itaúna e locações – casas e bares que, de fato, pararam no tempo”, descreve.