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Com 85% da arrecadação municipal atrelada à mineração, Mariana, na região central de Minas, anunciou ontem estado de calamidade financeira. O decreto foi assinado pelo prefeito Duarte Júnior (PPS), na sede da Associação de Municípios Mineradores de Minas (Amig), quase três anos e meio após o rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, no distrito de Bento Rodrigues.[pro_ad_display_adzone id=”44899″ align=”right”]
Segundo o chefe do Executivo, o problema vem se arrastando desde a tragédia, em 5 de novembro de 2015, e chegou ao ápice com a interrupção das operações da Mina de Alegria, da Vale, na última quarta-feira. A companhia é uma das controladoras da Samarco. A paralisação das atividades minerárias teria causado um rombo no orçamento da prefeitura, inviabilizando a prestação de parte dos serviços públicos.
Até agora, a arrecadação local sofreu uma queda de R$ 76 milhões no ICMS e R$ 27,8 milhões no Cfem, imposto que incide sobre a atividade minerária. “Hoje, nossa arrecadação mensal é de aproximadamente R$ 12,7 milhões, mas somente a folha de pagamento é de R$ 10 milhões”, afirmou o prefeito, alegando um déficit de até R$ 9 milhões ao mês.
Para evitar que o prejuízo se multiplique, Júnior anunciou que vai recorrer à Justiça e pedirá que as empresas mineradoras indenizem a cidade pelo prejuízo causado. “Vamos entrar com duas ações nesta semana na Comarca de Mariana para que paguem o tributo que cessou e mantenham os serviços essenciais”, disse.
Procurada, a Vale respondeu, por meio de nota oficial, que segue o que determina a lei. “A Vale recolhe todos os tributos incidentes em suas operações de acordo com a legislação vigente. A empresa vem mantendo diálogo permanente com os municípios de Minas Gerais”, diz o comunicado.
Sem recursos da mineração, prefeito de Mariana, Duarte Júnior, diz que serviços da cidade vão ser suspensos
Suspensão
Devido ao déficit, foram suspensas cirurgias eletivas, manutenção de estradas rurais e atividades de limpeza urbana. Transporte e repasses ao esporte também devem ser interrompidos, e cerca de mil funcionários públicos e terceirizados poderão ser desligados nas próximas semanas. O pagamento do 13º salário dos servidores municipais também deve ficar comprometido. “Entramos em caos financeiro. Estou indignado e preocupado com a falta de comprometimento social da Vale. Ela não pode virar as costas para um município onde lucrou por tantos anos”, disse Duarte Júnior.
O presidente da Amig e prefeito de Nova Lima, Vitor Penido (DEM), disse que o problema não é enfrentado apenas por Mariana. “Pelo menos outras dez cidades mineiras estão em estado crítico”, afirmou.
Em Nova Lima, que tem uma receita 40% dependente da mineração, os cortes de serviços devem começar no próximo mês, e o pagamento dos servidores municipais poderá ser atrasado por falta de recursos.
Uma reunião marcada para esta terça-feira (26/03), em Brasília, entre dirigentes da Amig e representantes da Agência Nacional de Mineração, vai buscar uma solução para o problema. Outro encontro está previsto para sexta-feira, com integrantes do primeiro e segundo escalões da Vale, em Belo Horizonte.
Paralisação de mineradora pode gerar prejuízo de R$ 7,7 bilhões
Após a decisão da Vale de paralisar as atividades para o descomissionamento de barragens que utilizam o alteamento a montante – mesmo método usado para depositar rejeitos em Mariana e Brumadinho –, a Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig) realizou um estudo sobre os impactos na economia e na empregabilidade no Estado causados pela medida.
Segundo a pesquisa, a redução de 40 milhões de toneladas de minério de ferro extraídas ao ano, anunciada pela própria mineradora, deve significar perdas de cerca de R$ 7,7 bilhões anuais na balança comercial, incluindo neste número o pellet feed (minério mais fino) necessário para a produção de 11 milhões de toneladas de pelotas (utilizadas na produção do aço).
Além disso, os prejuízos podem chegar a R$ 237,7 milhões referentes à Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) e a R$ 26,2 milhões da Taxa de Fiscalização de Recursos Minerais (TFRM), cuja finalidade é custear as atividades dos órgãos públicos que atuam junto ao setor de mineração.
Aproximadamente 65 mil empregos diretos e indiretos sofrerão com a paralisação das atividades da mineradora. A empresa poderá compensar o impacto por meio do aumento de produção em outros sistemas produtivos.
O estudo foi desenvolvido pela equipe técnica da Amig e coordenado pela economista Luciana Mourão. Ela explica que a pesquisa limitou-se a apontar os prejuízos relacionados à TFRM e à Cfem, além da balança comercial e empregabilidade.
No entanto, acrescenta que uma possível paralisação das atividades de mineração afetaria diversos setores da economia local e regional, de forma direta e indireta. “Portanto, o estudo não leva em consideração os impactos relacionados ao ISS, ICMS, IPI, dentre outros tributos”, diz a economista.