A retenção de recursos das prefeituras pelo Estado, drama que marcou a administração em Minas Gerais nos últimos dois anos, deve se tornar uma manobra mais difícil de acontecer daqui para frente. Com a aprovação do PL 499/2019 pela Assembleia Legislativa, municípios deverão receber diretamente da União e de instituições bancárias os repasses constitucionais, sem a intermediação do governo do Estado.
A legislação é válida para os repasses de IPVA e ICMS, segundo dispõe o artigo 158 da Constituição Federal, bem como a Lei Complementar Federal 63/1990. Hoje, esses valores são transferidos para o cofre dos estados, que repassa semanalmente aos municípios 25% da arrecadação do ICMS e 50% do IPVA, conforme previsão constitucional.
O instrumento vai permitir que valores essenciais para as prefeituras não corram mais o risco de atrasar, como analisa o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda. Isso porque o projeto prevê que os próprios bancos responsáveis por operacionalizar os recebimentos de IPVA e ICMS façam esse repasse nas contas dos municípios, sendo estas instituições “responsabilizadas civil e administrativamente pelos repasses não efetuados no prazo previsto”, conforme prevê o artigo 1º do texto.
As instituições bancárias que deixarem de cumprir a legislação deverão suprir os repasses com “patrimônio próprio pelo pagamento devido a título de parcela de IPVA e ICMS não repassado na data correta, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção pela taxa Selic desde a data que os valores deveriam ser creditados”, de acordo com o artigo 5º da legislação.
Nos dois últimos anos, durante a gestão do ex-governador Fernando Pimentel (PT) e no início do mandato do atual chefe do Executivo, Romeu Zema (Novo), o governo de Minas chegou a reter até 50% dos repasses de ICMS e IPVA dos municípios. No entanto, não havia previsão legal de sanção ao Estado.
“O transtorno que esse tipo de manobra nos trouxe foi enorme. Por mais de dois anos, tivemos valores altos, da ordem de uma média de R$ 100 milhões por semana, que foram confiscados de um total de R$ 200 milhões que todos os municípios dividem. É dinheiro usado para custear salários, contas de água, luz. Depois do acordo com a gestão do governador Zema, pelo menos a regularidade dos repasses tem acontecido”, conta Julvan.
Sanção
Aprovado em segundo turno na semana passada, o PL 499/2019 ainda requer a sanção do governador Romeu Zema (Novo). A expectativa do deputado Hely Tarqüínio (PV) é que o chefe do Executivo sancione o projeto, uma vez que o Estado fechou um acordo para pagar R$ 7 bilhões dos R$ 13,3 bilhões devidos pelo governo às prefeituras — as parcelas começam a ser depositadas a partir de janeiro do ano que vem.
“É um projeto que visa garantir que esses repasses não voltem a atrasar. Vimos como isso dificultou as situações das prefeituras. E, diante da situação fiscal do Estado, com um déficit de R$ 13 bilhões, que pode se elevar bastante, os municípios precisam ser resguardados para a economia e a vida das cidades também serem. Muitas cidades dependem quase que 90% do dinheiro desses impostos”, avalia o deputado do PV.
Outros impostos
Outros impostos aos quais os municípios têm direito, como Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), Imposto de Renda (IR) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), não integram o PL porque já são repassados diretamente às prefeituras.
Acordo
Em abril deste ano, o governo de Minas e a Associação Mineira dos Municípios (AMM) firmaram um acordo para que o Estado pague R$ 7 bilhões devidos pelo governo às prefeituras, de um total de R$ 13,3 bilhões devidos desde a gestão do ex-governador Fernando Pimentel (PT).
Segundo balanço do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que mediou e homologou o acordo, 97,6% das prefeituras aderiram ao termo, o equivalente a 833 cidades — até sexta-feira, o sistema continuava aberto para cadastro de prefeituras interessadas. Esse foi o primeiro passo para a regularização dos repasses de ICMS, IPVA e Fundeb, atrasados há pelo menos dois anos.
Pelos termos do acordo, os pagamentos começam a ser feitos apenas a partir de 2020. O governo irá quitar primeiro o valor de R$ 1,046 bilhão devido na gestão do governador Romeu Zema (Novo). Serão três parcelas de R$ 339 milhões, entre janeiro e março do ano que vem.
Em seguida, a partir de abril de 2020, começam a ser pagos R$ 6 bilhões dos R$ 12,954 bilhões confiscados em impostos na gestão do ex-governador Fernando Pimentel (PT). Os valores serão depositados em 30 parcelas de R$ 200 milhões, com previsão de quitação integral em 2022. O acordo também prevê que, caso haja fluxo de caixa, poderá haver antecipação das parcelas.